No dia 1º de abril viajou a Nova York para uma homenagem
a Bob Hurwitz, presidente durante
três décadas da Nonesuch Records e, acompanhado pelo Kronos Quartet, cantou Un
Vestido y un Amor (Um Vestido e um
Amor), de Fito Páez. “A canção fala que fumamos
uns baseados em Madri”, diz rindo. Sua
turnê europeia passa por Barcelona (Palau
de la Música) na sexta-feira, por A Corunha (Palacio de la Ópera) no dia 30 e Madri (Teatro Circo Price) em 4 de maio.
Caetano se apresenta com Teresa Cristina (Rio de Janeiro, 1968), que interpreta um dos grandes compositores de samba: Cartola. Para ele,
isso tem a ver com o prazer de cantar com os outros: desde pequeno, quando aprendeu a cantar com a mãe, ao lado do
rádio. Nesses concertos, “Teresa canta cerca de 10 canções de Cartola; depois eu canto com meu violão um monte
de canções que não estavam no show
com Gil, e para o bis fazemos juntos mais três ou quatro canções minhas”.
Em 2017 seu primeiro disco faz cinquenta anos. “As comemorações
são um pouco chatas não? [ri]. Como
diz Fernanda Montenegro, a grande atriz, muito reverenciada, ‘meu filho, na semana que vem não estarei aqui
porque vou ter de sofrer outra homenagem”.
Também faz aniversário, de vinte
anos, Verdade Tropical, seu livro de memórias e reflexões, que ganhará nova edição: “Vou reler e escrever algo
mais. Quero comentar
como vejo agora algumas coisas de que falei”.
Stefan Zweig escreveu Brasil, País do Futuro,
mas o Brasil parece condenado a ser só uma
promessa. “O Brasil tem algo meio desafinado, e isso também faz parte do
seu encanto”, afirma Caetano,
que qualificou o impeachment da presidenta Dilma Rousseff de “golpe de
Estado em câmera lenta”. “Seu Governo não foi bom, mas há
um aspecto muito reacionário na sociedade brasileira. Lula, uma figura
fortíssima no imaginário popular, com razão,
dificilmente sairá das complicações judiciais devido à tradicional promiscuidade entre as empresas e os
governos do Brasil”, explica. “Aqui os ricos e
poderosos nunca iam para a cadeia. Agora, pela primeira vez, há ricos e
poderosos na prisão”.
Hurwitz insiste para ele gravar todas as suas canções só
com voz e violão. “Agora quero fazer
algo com meus três filhos [Moreno, Zeca e Tom]. Porque adoro o que fazem e para estar perto deles", afirma. “Na
Argentina estão me
pedindo um disco de tangos, e me dá vontade
de fazer, mas também quero compor umas canções que ainda não sei bem como vão ser para fazer algo diferente que
ainda não sei o que é. Penso tantas coisas que não acredito que terei tempo de fazer tudo”.
Com A Foreign Sound,
disco com clássicos do repertório norte-americano, adiantou-se mais de dez
anos aos últimos de Dylan. “Só ouvi Shadows
in the Night, que não me empolgou.
Sua maneira de cantar é tão anti-Sinatra”, comenta rindo. Sobre o Nobel de Literatura a Bob Dylan, de quem gravou canções como It’s Alright, Ma (I’m Only Bleeding) e Jokerman, acredita que “foi tudo muito engraçado, muito Dylan”. “Há
um atraso por parte da organização do
Prêmio
Nobel sobre a questão de alta e baixa
cultura. É algo dos anos 1960 que
eles estão resolvendo agora porque são o Nobel e não podiam fazê-lo mais rápido”, diz em tom de
brincadeira.
Pensou que
se tornaria O Homem Velho de sua
canção? “Pensava pouco nisso. Quando criança, minha prima mais velha me
levou a Santo Amaro para ver umas dessas pessoas que leem a mão. A senhora fez umas previsões e
disse que ia chegar aos 68 anos. Fiquei muito tranquilo
porque eu devia ter uns 10 e achava aquilo muito distante”. Sempre fui uma pessoa mais de dúvidas que de
certezas. “Sim”, responde rápido. “Parece que dessa vez tive certeza, mas depois fiquei um pouco em dúvida”,
acrescenta rindo.
“Uma das coisas que gostaria de ter feito é um filme
sobre o samba inspirado em Flamenco de Saura. Quando o filme estreou pensei muito nisso. Dona Ivone Lara era, naquela altura, uma das pessoas que
sambavam da maneira mais linda que se pode imaginar.
Fazia uns movimentos incríveis, mas acaba de completar 96 anos e não anda mais”. O cinema, sua grande paixão, costuma
surgir em muitas de suas conversas e está presente
em algumas de suas letras. Na juventude, trabalhou como crítico de cinema em um jornal de Salvador. Em 1986 dirigiu
seu primeiro e único filme, Cinema Falado,
e parece que não abandonou o sonho de
voltar a filmar. “O desejo de filmar continua
latente. Sinto saudade, e muitas, de uma vida dedicada ao cinema”.
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