“E se eu deletasse o meu Facebook?” Foi essa a pergunta que veio à cabeça de Felipe Teobaldo, de 25 anos, numa terça-feira tediosa qualquer. Ele rapidamente publicou o questionamento na rede social. Os comentários foram do mais entusiasta – “isso mesmo, a vida está lá fora” – ao mais pessimista – “você é louco?”. No meio de opiniões polarizadas, uma se destacou: “Saia, escreva um blog e divida com a gente o que está sentindo.”
No blog ’100Face’, os usuários relatam suas dificuldades sem a plataformas e contam as recaídas.
E foi isso mesmo o que ele fez. Percebendo que faltavam 108 dias para o fim do ano, o publicitário e consultor Teobaldo – ou Teo, como costuma ser chamado –, anunciou em seu Twitter, e depois em seu blog e no próprio Facebook, que ficaria 100 dias sem se logar na plataforma.
Logo começaram a aparecer mais e mais voluntários, e o projeto tomou forma: 100 pessoas, 100 dias, sem Facebook. Assim, no dia 22 de setembro, a maratona começou.
Além de se manter fora da maior rede social do mundo, que recentemente alcançou um bilhão de usuários, os participantes narram sua experiência em um blog, o 100face, que tem um quê de diário, com depoimentos bem pessoais e curiosos. Para uns, a tarefa tem sido tranquila; para outros, insuportável.
Os participantes relatam suas tentativas de ocupar o vazio deixado pelo Facebook: ler um livro, retomar um blog, ir ao parque, voltar à academia. Embora empolgados com a nova rotina, compartilham a dificuldade de conversar com os amigos por outros meios e de acessar sites e serviços integrados à plataforma, a frustração por ficar de fora de discussões e eventos, além da ansiedade para ver suas notificações e mensagens.
Marcos Médici, planejador digital, de 30 anos, é um dos voluntários no projeto. “É como se eu só tivesse telefone fixo e todo mundo tivesse celular”, disse ele ao Link. “O que eu mais sinto falta é usar a mesma ferramenta que meus amigos utilizam. Me sinto de fora, quase um bullying que optei por sofrer.”
Experiência. Teo encara o projeto como um experimento social. “Procuramos o auxílio de uma pesquisadora, um psicólogo e um antropólogo para gerenciar esse projeto da maneira mais interessante e responsável possível”, disse.
Antes de o projeto começar, os participantes preencheram um questionário para traçar um perfil dos exilados da rede social. Quando terminarem os 100 dias, os dados vão ser analisados para entender os efeitos da ausência no Facebook sobre eles.
O idealizador afirma que, sendo heavy user, criou o projeto por causa do frio na barriga que a ideia lhe causava. “A pergunta não é quanto tempo você aguenta fora do Face. Quero saber do que você depende para ser feliz!”, questiona. “Será que é do Facebook que a gente depende ou dos elementos sociais, muito importantes para a nossa vida, que hoje são hegemonicamente mediados por ele?”
Três semanas já se passaram, e cerca de um quinto dos participantes não aguentou e já se rendeu à rede de Zuckerberg novamente. No entanto, o que era uma pesquisa acabou virando uma terapia em grupo: os participantes trocam – pelo Twiter ou pelo blog – mensagens de apoio e incentivo, principalmente quando alguém ameaça desistir.
“O Facebook é o grande catalisador social do momento”, diz a professora Luciana Ruffo, do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática da PUC-SP. Sobre a necessidade contemporânea de midiatizar os acontecimentos, ela diz: “O desejo é muito mais mostrar para o outro onde se esteve do que na verdade guardar uma lembrança de um momento bom”.
Já o professor Cristiano Nabuco, coordenador do grupo de apoio à dependência de internet do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, diz: “Hoje as pessoas trocaram o prazer de estarem juntas pelo prazer de se comunicar.” Ele afirma que a rede social nos permite observar os usos e costumes e testar modalidades de expressão, uma vez que é possível elaborar reações e respostas. “Não deixa de ser um tubo de ensaio de uma exposição mais cuidada, mais guardada; mas ainda é você.”
Para Teo, o avatar, ou nossa versão online, é integralmente feliz, completo e bem-sucedido. “Ele é a construção do que gostaríamos de ser. E a lacuna entre o que fazemos na plataforma e o que efetivamente somos é onde trabalha o 100Face”.
PAPP SEM FACE
Para entrar no clima, fiquei uma semana sem Facebook. Não sou das mais ativas; mas aproveito cada momento livre ou de tédio para ver o que as pessoas estão dizendo, as fotos e os links compartilhados. Nessa semana sem Facebook, meu dedo coçava para clicar no app do celular, ainda mais vendo que chegavam notificações. Migrei a ansiedade para o Instagram, checando o app mais do que costumo. Mas não tive recaídas. Cem dias? Aí eu já não sei…
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