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Afastar-se ou dar gelo é a melhor solução para um desentendimento?

 Estratégia comum após longas discussões ou mesmo quando a relação não anda bem, dar um gelo em um amigo, familiar ou parceiro pode ser uma maneira de ganhar tempo e lidar com um sentimento incômodo ou mesmo esperar a situação se acalmar para retomar o diálogo. Como remete a própria expressão, o comportamento consiste em interromper o diálogo e evitar o contato físico durante um determinado período de tempo, de maneira pontual, geralmente buscando que o outro reavalie os comportamentos que tenham desagradado.

"Dentro de um relacionamento esse afastamento, pode ser decidido por uma das partes ou ambas e ele consiste em ignorar o outro, não retornando ligações, mensagens, cancelar encontros, se afastar fisicamente e emocionalmente" define Cláudia Regina Ribeiro, psicóloga clínica do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo. Ainda segundo Ribeiro, isso normalmente acontece quando existem problemas no relacionamento ou a relação ainda não está muito bem estabelecida, "falta segurança na comunicação e existe pouca proximidade" esclarece.

Ignorar alguém, mesmo que pontualmente, independentemente do grau de relação estabelecido, pode não ser a melhor estratégia a se tomar e muito menos contribuir para a resolução do conflito ou questão que gerou a necessidade de afastamento. "A depender do contexto, este pode ser considerado um modelo de comunicação passivo-agressivo, uma vez que as pessoas utilizam dessa ferramenta como uma forma de 'se manter no controle' da relação" pondera Ilíada Alves, psicóloga especialista em Terapia Cognitiva pelo Núcleo de Terapia Cognitiva da Bahia e Preceptora da Residência em Psiquiatria do Hospital das Clínicas Dr. Ramadês Nardini.

Ao diminuir a comunicação com o outro, o distanciamento aumenta e narrativas próprias também podem ser criadas internamente por quem decidiu pela interrupção dos contatos. "As ideias e pensamentos construídos para justificar esse distanciamento e a falta de informações sobre os motivos reais são geralmente piores do que a realidade, e acabam deixando em aberto fantasias, suspeitas e inseguranças no relacionamento" salienta Ribeiro. Para ela, o excesso de silêncio e distância também pode dificultar o encontro de soluções e mesmo mudanças de comportamento e atitude.

Dar ao outro a possibilidade de vivenciar sua falta

Outra situação comum, relatada como justificativa ao afastamento deliberado de alguém, é a dificuldade em ser ouvido. Às vezes os conflitos ganham proporções maiores porque não existe um processo de escuta e de entendimento do outro. Para Mônica Soutello, psicóloga clínica especializada pela USP (Universidade de São Paulo) e Diretora da Clínica Miosótis, o afastamento também pode produzir outros efeitos, como fazer com que o outro se perceba autor de determinadas atitudes que machucam e prejudicam a relação. "Existem situações onde este afastamento se faz necessário pelo fato do relacionamento ter se tornado abusivo" adiciona Soutello. Muitas vezes existe uma tentativa reiterada de diálogo por uma das partes que não surte efeito, com o aumento dessa frequência "o afastamento surge como possibilidade de demonstrar de outra maneira que algo não está bem, já que através do diálogo não foi possível" orienta.

Nesse caso, um afastamento pontual pode ajudar o indivíduo a "analisar a situação e observar os seus próprios limites para então definir o meio mais adequado de conduzir a situação conflituosa", adiciona Alves. A manutenção de relacionamentos, independentemente de sua natureza, também é condicionada à determinados atributos que precisam ser adquiridos. "As habilidades importantes para a condução efetiva de um relacionamento incluem evitar que as mágoas se acumulem, resolver os conflitos e restaurar ou terminar o relacionamento se necessário" finaliza a psicóloga.

É preciso comunicar o afastamento?

Para Ribeiro a comunicação dessa necessidade pessoal de afastamento deve observar o vínculo estabelecido na relação. Alguém com quem se tem pouca intimidade e cuja relação acaba de iniciar não necessitaria, portanto, ser comunicado. "Se considerar importante ou não se sentir bem, é possível somente explicar o motivo do afastamento com tranquilidade e respeito", ressalta.

A questão muda de tom quando os relacionamentos são mais densos, de mais longo prazo e contato frequente. "Em um relacionamento assim, é importante comunicar ao outro que se precisa desse tempo, explicar os motivos até mesmo em respeito ao que viveram juntos e a sua expectativa com o afastamento" reflete Ribeiro.

Em alguns casos, a ausência de comunicação do afastamento, utilizada como ferramenta para evitar conflito pode conter uma hostilidade disfarçada, sugere Ilíada Alves. Para ela é possível expressar o que se pensa e sente "e ao mesmo tempo validar, demonstrar empatia pelo próximo e se manter firme no seu objetivo" de se afastar ou distanciar-se dessa relação.

Entretanto, diante de uma tentativa consistente de diálogo sem sucesso, Soutello entende que o afastamento não comunicado pode ser uma ferramenta para impulsionar novas percepções. Diante de uma comunicação falha, "devemos nos perguntar se a falha é do ouvido ou da boca. Se considerarmos que a responsabilidade é do ouvido, não adiantará falar inúmeras vezes pois não há disponibilidade de escuta", pondera. E deste modo, o afastamento seria utilizado "como uma forma de comunicar que algo mudou", inclusive, para que próprio indivíduo que decidiu se afastar também se conscientize dessa necessidade.

Quais os limites do "gelo"?

A sobrecarga emocional e a indecisão sobre o que realmente se deseja na relação também podem atrapalhar a capacidade de conduzir as situações conflituosas de modo efetivo. "Se distanciar pontualmente pode ajudar a lidar com a esgotamento emocional e pensar nas possibilidades de resolver um problema" aponta Alves. Ao manter uma distância do que está sendo vivido, temos oportunidade de enxergar melhor o que sentimos. Assim, conseguimos avaliar de forma mais sensata prós e contras desta relação. Outro benefício é que não deixamos o outro nos machucar, colocamos limites. "É como se mostrássemos até onde o outro pode ir ou não", complementa Soutello.

Compartilhar o mesmo espaço físico não configura necessariamente uma dificuldade para o afastamento. "É o que podemos chamar de afastamento psíquico" esclarece Soutello. Morar na mesma casa, trabalhar ou estudar no mesmo ambiente não necessariamente estabelecem ou criam algum tipo de vínculo, como explica Ribeiro. "Dividindo o mesmo ambiente, entretanto é preciso tomar alguns cuidados para que a distância, não prejudique outras relações em comum ou que cause situações constrangedoras", reforça. Por isso, "expressar claramente a sua necessidade e estabelecer acordos de convivência é um facilitador", adiciona Alves.

No caso de relacionamentos muito conflituosos, desrespeitoso ou agressivos, as psicólogas entrevistadas pelo VivaBem consideram que o afastamento deve acontecer de maneira mais radical e inclusive considerar um rompimento definitivo. No caso dos relacionamentos destrutivos, "permanecer muito tempo nesse tipo de relação pode se tornar algo muito problemático" alerta Alves. "Dessa forma, o rompimento da relação somado ao investimentos nas outras esferas da vida pode ajudar a preservar o autorrespeito, além de trazer benefícios à saúde mental", pondera.

Como saber que chegou a hora de uma reaproximação e de retomar o diálogo?

A decisão pela retomada do diálogo deve seguir um momento que seja favorável para ambas as partes, orienta Alves. "A partir do momento em que que você perceber que conseguiu analisar a situação de forma clara e definir um objetivo para ela", reflete. É importante "observar se os comportamentos que geraram a necessidade de afastamento podem de fato mudar", pondera Soutello. Ainda é importante verificar se é possível identificar um ganho de maturidade para reiniciar a comunicação, de modo que se possa "ressignificar os problemas do passado, dores e mágoas" finaliza Ribeiro.

Para retomar o diálogo, Ribeiro sugere iniciar uma conversa natural, demonstrando interesse no outro, incluindo-o nas atividades e eventos, informando sobre as novidades, seus aprendizados, curiosidades e principalmente os interesses em comum e recordações de momentos bons. Alves também salienta que é importante compartilhar aspectos pessoais para que "o outro descubra o que é realmente importante para você e as suas necessidades".

A retomada do relacionamento de maneira saudável também precisa considerar investimento nas habilidades de comunicação de ambas as partes, "exercitar a escuta empática e flexibilidade, validar o sentimento do outro e cultivar ações de afeto e cuidado" finaliza a psicóloga.

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