Basta um passeio virtual pelo Portal da Transparência, site que expõe a contabilidade do governo, para constatar que os repasses de verbas do Ministério do Turismo não dão prioridade aos eventos que a presidente Dilma Rousseff apontou como os "grandes desafios" da pasta - a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016.
A relação das verbas transferidas para "infraestrutura turística" neste ano mostra diversas prefeituras do interior com repasses maiores que os do Rio de Janeiro e de sedes do campeonato mundial de futebol de 2014.
São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Salvador e Brasília não receberam nada para infraestrutura em 2011. Neste quesito, o Rio, que tem 6,3 milhões de habitantes e em 2016 será sede da 31ª Olimpíada da era moderna, foi beneficiado com apenas R$ 475 mil - meros 0,25% dos recursos já destinados a projetos de infraestrutura turística desde o início do ano.
A título de comparação, a cidade paulista de Birigui, que tem pouco mais de 100 mil moradores e não é conhecida por seus atrativos turísticos, recebeu R$ 1,9 milhão para melhorar sua estrutura para acolher visitantes - quatro vezes mais do que a capital fluminense.
Sinais. No rateio das verbas de infraestrutura por Estados, Sergipe aparece à frente de São Paulo (R$ 32 milhões contra R$ 24 milhões). Goiás, Roraima e Mato Grosso do Sul - todos em posição periférica em relação ao turismo - embolsaram mais recursos que o Estado do Rio de Janeiro, o 21º do ranking.
Outra mostra da falta de prioridade para os grandes eventos se verifica na destinação das verbas do programa de "Sinalização Turística". Desde o início do ano, nenhuma futura sede da Copa foi contemplada. Estão na lista um município do Espírito Santo (Vila Velha) e cinco de São Paulo (Campinas, Cedral, Itapira, Piacatu e Rubineia).
No programa de "Implantação de Centros de Informação Turística", uma única cidade foi beneficiada desde o início de 2011: Votuporanga (SP). O site da prefeitura lista no local dois atrativos: uma feira de artesanato e uma feira livre que é "referencial no turismo da região" e oferece aos visitantes "verduras, frutas e legumes fresquinhos".
Desvios. No programa de "Qualificação de Profissionais Associados ao Segmento de Turismo", mais distorções. Os R$ 900 mil que aparecem como transferidos para a cidade de São Paulo são, na verdade, referentes a um convênio de "capacitação profissional para o turismo no Estado do Amapá". A única relação com a capital paulista é o fato de ela sediar a entidade que assinou o convênio.
Trata-se do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento de Infraestrutura Sustentável (Ibrasi), entidade que está no cerne do escândalo que provocou a prisão de dezenas de pessoas pela Polícia Federal em agosto, entre eles o então secretário executivo do Ministério do Turismo, Frederico Silva da Costa.
Segundo a PF, a entidade está envolvida no desvio de cerca de R$ 4 milhões que deveriam ter sido utilizados em qualificação de mão-de-obra. Os recursos foram destinados ao Ibrasi graças a uma emenda ao Orçamento apresentada pela deputada Fátima Pelaes (PMDB-AP). Ela negou envolvimento em irregularidades.
Votos. Além de revelar os desvios, o escândalo evidenciou o peso dos critérios políticos na destinação das verbas do ministério. O próprio Gastão Vieira, recém-nomeado ministro do Turismo, admitiu ao Estado que seu mapa eleitoral foi levado em conta na época em que apresentou emendas para beneficiar prefeituras do Maranhão.
Uma das emendas, de R$ 2,5 milhões, teve como beneficiárias quatro cidades em que Vieira foi candidato a deputado federal mais votado em 2010. Em uma delas, teve 41% dos votos válidos.
O Ministério do Turismo é apenas um dos órgãos envolvidos nos preparativos para 2014 e 2016 - ou seja, as cidades-sedes também recebem investimentos federais por outras vias.
Lógica turística
R$ 1,9 mi é o total destinado ao turismo em Birigui, no interior paulista
R$ 475 mil devem ser repassados ao Rio, que receberá Copa e Olimpíada
R$ 900 mil são atribuídos a São Paulo mas destinados, de fato, ao Amapá
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