Foram quatro anos de relacionamento e um de terapia até que a publicitária Carla (que prefere não revelar o sobrenome) conseguisse aceitar que aquele amor não iria adiante. Apaixonada, ela era incapaz de ver que o colega de trabalho comprometido continuava a tocar a vida e fazer planos de casamento com outra --enquanto mantinha as falsas expectativas de Carla. "Estava tão envolvida que achava que ele era o homem da minha vida. Qualquer sinal, por menor que fosse, fazia com que eu renovasse as esperanças", diz ela. "Demorei para entender e aceitar que ele não me amava."
Assim como Carla, muitas pessoas têm dificuldade de encarar um problema. Preferem desviar a atenção a aceitar que ele existe e precisa de solução. De acordo com o psicólogo especialista em relacionamentos Thiago de Almeida, confrontar a realidade nem sempre é simples. Isso porque, mesmo sem perceber, nos comportamos de modo a sofrer o mínimo possível, ainda que isso signifique adiar o problema e não enxergar as coisas como elas realmente são. "O enfrentamento da realidade é difícil. Por isso é tão comum que pacientes abandonem a terapia quando o psicólogo se aprofunda na discussão dos problemas", diz ele.
"Algumas pessoas crescem habituadas a ter alguém que assuma seus problemas. É como aquele pai ou mãe que sempre vai à escola para resolver a briga do filho com os colegas e nunca deixa a criança fazer nada sozinha. Chegará o dia em que essa criança não terá quem interceda. Quando adulta, esse tipo de pessoa tem atitudes infantilizadas, pois vive se colocando no papel do 'filhinho que precisa ser cuidado'
Angélica Amigo, psicóloga
A dificuldade de encarar algumas situações vem do medo, da insegurança e da autodepreciação, segundo Hélio Deliberador, professor do Departamento de Psicologia Social da PUC- SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). "Sofremos para admitir os problemas e relutamos em pedir ajuda", afirma. "Esquecemos que a vida é um desafio permanente e que sempre há obstáculos a enfrentar. É importante entender que a nossa capacidade de resolver os problemas é ilimitada", diz.
Para o psicólogo Armando Ribeiro das Neves Neto, do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo, a forma como somos capazes de lidar com problemas está relacionada com a história de vida e a educação de cada um de nós. "Somos muito influenciados por modelos. Pais passivos podem contribuir para a formação de filhos com maior dificuldade de reagir diante das dificuldades", afirma.
A psicóloga Angélica Amigo afirma que as pessoas têm muita dificuldade de encarar os problemas do dia a dia porque não conseguem lidar com frustrações. "O ser humano não quer perder nunca" diz. "Quando se depara com um problema, tende a negá-lo inicialmente, como uma maneira de resistir à realidade e se proteger do sofrimento ou, algumas vezes, pode até 'hiperdimensionar' o problema, se colocando no lugar de vítima do mundo e, assim, conseguindo a atenção de todos."
Angélica explica que todos nós sofremos "pequenos lutos" no nosso dia a dia, além dos que se referem à morte de alguém querido. Segundo ela, é importante reconhecer o que foi perdido e se apropriar daquilo que se está sentindo. "Algumas pessoas acham que resolvem o problema fugindo dele. Recusam-se a falar sobre o fim do relacionamento, a perda do emprego, a morte de alguém. Ficam se enganando, imaginando que, se não pensarem no problema, ele irá se resolver, mas não vai"
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