A Livros de Safra está começando agora a vender exemplares pelo ecossistema da Livraria Cultura/Kobo.
“Não é fácil fazer a transição do papel para o digital, não é fácil ficar buscando entender onde existirá valor na cadeia, valor monetário, não apenas representatividade ou importância de função, porque o mundo é pragmático e as contas são pagas com dinheiro”, escreveu.
Ele me disse que concorda com o que eu escrevi, mas acha necessário “pensar na realidade de mercado”. Eu achei bem interessante os pontos que ele – do mercado – levantou. E pedi autorização para reproduzir o que ele me escreveu:
Entendo os seus pontos, concordo com eles, mas acho necessário pensar na realidade do mercado. Estou na segunda editora, na primeira, vendida em 2002, tinha um enorme desconforto com a eminente mudança tecnológica que a ameaçava, cheguei inclusive a vender um ebook nos idos de 2001, numa tecnologia que não existe mais. Acabei vendendo a empresa, descobrindo que também tenho um lado criador de conteúdo, lancei no ano passado meu primeiro romance e, depois de tentar um outro negócio, voltei a ter uma editora, tradicionalmente um negócio com dificuldades de falta de volume.
Tenho hoje 2 iPads, 1 Nook, 2 Kindles. Mas quando vou ler, ainda prefiro o papel, mesmo que depois minhas anotações não sirvam para nada porque não é fácil nem para mim entender a minha letra, mas faz parte do meu processo de contato com o conteúdo. A editora tem os seus livros convertidos mas só agora estamos iniciando a venda por meio da Cultura/Kobo, sim, não é fácil fazer a transição do papel para o digital, não é fácil ficar buscando entender onde existirá valor na cadeia, valor monetário, não apenas representatividade ou importância de função, porque o mundo é pragmático e as contas são pagas com dinheiro.
Sim, a Amazon faz um trabalho admirável, é bacana poder comprar um livro quando se tem vontade, mas fiz uma conexão do nosso assunto com a entrevista do aliás de ontem com o filósofo Kwame Anthony Appiah, e pode parecer que seja apenas uma defesa de classe, embora confesse aqui meu desejo de poder apenas escrever romances. Estava no Aliás de ontem e terminava assim: “… Mas o problema vai continuar enquanto vivermos num mundo sem editores. Mesmo o mais vulgar tabloide tem um editor tomando decisões. Na internet, o filtro se foi.”
O modelo de negócios de editoras já é complexo, produtos de poucas dezenas de reais devem merecer volume de centenas de milhares, não de 1.000, 2.000 cópias. Se a demanda não é elástica, não serão o desaparecimento de alguns reais que a levarão para as tais muitas centenas, vários milhões.
Sou um tanto mais velho do que você, mas no campo cultural é muito difícil, pela democracia e diversidade de conteúdo que as regras clássicas de mercado se imponham, na TV aberta impera o que? Nem o Guardian está acreditando que irá sobreviver? Acho que na questão do livro digital, há um tanto desse conflito. Concordo que lançar depois é só abrir caminho para a pirataria. Só faria uma reparação no seu artigo: eu não utilizaria a Amazon, uma empresa tão pouco transparente como exemplo. É claro que a Amazon não está preocupada com os livros, como qualquer operação daquele porte, vê neles uma forma de ganhar visibilidade e marca para competir em mercados que lhe deêm a condição de apresentar os dados que os acionistas esperam.
Eu sigo aqui, tentando encontrar o preço certo de um e-book, aliviado de não precisar imobilizar em estoque, mas triste em não poder me deparar com livros nas casas das pessoas. Nada mais gostoso do que tentar adivinhar se o habitante leu ou não os livros que mantém e casa, e se leu, em alguns casos, se aproveitou algo.
É inevitável, concordo, mas acredito que pela sua idade e acesso, vale aprofundar a discussão. Um cantor tem um show, o contato com a obra é fácil, já o escritor requer atenção do leitor por algumas horas, é tudo mais lento, verdade que mais profundo, embora não conheça nenhum escritor capaz de arrancar lágrimas e tantas lembranças quanto um músico.
Concordam?
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