A Comissão de Assuntos Econômicos do Senado pode votar na semana que vem, em segundo turno, um projeto de lei que regulamenta serviços como Netflix, Now, TikTok e Youtube e obriga plataformas de streaming a pagar a Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional). Se for aprovado pelo colegiado, o texto vai direto para a Câmara, sem passar pelo plenário do Senado, pois trata-se de uma proposta terminativa.
O projeto já foi aprovado por 24 votos a 0, em primeiro turno, em 22 de novembro. Agora, precisa ser votado outra vez no colegiado. O relator do PL 2.331/2022, senador Eduardo Gomes (PL-TO), disse ao Estadão que está fazendo “ajustes de texto” para que não haja “brechas” para “interpretações” na nova legislação.
O texto aprovado em primeiro turno prevê uma cobrança anual da Condecine, com uma alíquota máxima de 3% da receita bruta das plataformas no mercado brasileiro. O cálculo da receita incluiria ganhos com publicidade e excluiria tributos indiretos, por exemplo. O valor da contribuição será reduzido à metade caso metade do conteúdo do streaming seja nacional. Hoje, os streamings não pagam essa taxa.
A Condecine é uma contribuição que incide sobre obras cinematográficas e videofonográficas comerciais. Os recursos arrecadados integram o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e ajudam a financiar o setor. Segundo a Agência Nacional do Cinema (Ancine), o fundo é atualmente o maior incentivo ao audiovisual brasileiro.
Após a primeira votação na CAE, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) apresentou uma emenda para alterar a relação das empresas que devem pagar a taxa. O projeto de Eduardo Gomes incluiu plataformas de compartilhamento de conteúdo audiovisual, casos de Youtube e TikTok, como contribuintes da Condecine.
A emenda de Izalci retira a menção às empresas do texto do relator. O senador também exclui todos “serviços de compartilhamento de conteúdo audiovisual” do campo de aplicação da lei. O texto do relator excluiu apenas os “conteúdos gerados pelo usuário e não remunerados pelo provedor” - os vídeos “caseiros”.
“O projeto de Lei, embora voltado ao fomento do ecossistema audiovisual profissionalizado, acaba submetendo ao mesmo regime jurídico conteúdos gerados por usuários comuns, ou seja, aqueles conteúdos organicamente inseridos nas plataformas sem que haja curadoria do provedor do serviço de vídeo sob demanda”, afirma Izalci.
As sugestões do parlamentar podem ser acatada de forma integral, parcial ou rejeitadas. “A gente está analisando (a emenda), vendo se sai o acordo”, afirmou Eduardo Gomes.
O texto não prevê cobrança direta para influenciadores. Em 20 de novembro, o Youtube, controlado pelo Google, afirmou que a “política faz pouco sentido quando aplicada a uma plataforma de conteúdo gerado por usuários”. Em texto publicado no blog da plataforma, o Youtube afirmou que “fazer com que as plataformas que hospedam seu conteúdo contribuam com a taxa retiraria dinheiro do ecossistema e do bolso dos criadores”.
Eduardo Gomes afirmou que a votação do projeto de lei deve ocorrer na “terça ou quarta”. A data depende de outros temas que tramitam na Comissão como as indicações para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
“Está tudo caminhando para um desfecho favorável”, afirmou. “(O projeto) regula um setor que é muito presente na vida das pessoas e que estava até agora absolutamente no limbo. Passa a existir um sistema de streaming e de vídeo sob demanda (VoD - Video on Demand) regulado.”
O Ministério da Cultura participou das discussões do projeto 2.331/2022, que tramita no Senado. A ministra Margareth Menezes criou um grupo de trabalho com integrantes da pasta e da Ancine para discutir o tema.
Os representantes se reuniram entre junho e agosto e formalizaram oito recomendações para o projeto. Dentre elas, que a adoção de alíquota da Condecine seja “compatível e em consonância com as experiências internacionais”.
Durante a tramitação da proposta no Senado, o projeto recebeu críticas de quem entendia que a Condecine não poderia ser paga da mesma forma por todas as empresas de VoD. Ou seja, a Netflix, que oferece um catálogo de obras audiovisuais profissionais, não poderia pagar o mesmo imposto do Youtube, que também hospeda vídeos caseiros.
O Ministério da Cultura chegou a sugerir que a Ancine decidisse o que é uma obra audiovisual e o que é um vídeo caseiro. “Houve um impasse em torno dos conteúdos gerados por usuários em plataformas de compartilhamento de conteúdo e o MinC fez essa sugestão como uma forma de buscar um acordo para a votação do projeto”, afirmou a pasta ao Estadão. “O MinC defende que essa questão seja definida em regulamento.”
O projeto 2.331/2022 é de autoria do senador Nelsinho Trad (PSD-MS). O texto aprovado pela CAE e que será votado em turno suplementar é uma proposta alternativa do senador Eduardo Gomes. Além da cobrança da Condecine, o relator propõe que as plataformas deverão manter quantidades mínimas de conteúdos audiovisuais brasileiros “à disposição permanente e contínua” em seus catálogos. Metade deste total deverá ser de conteúdo brasileiro independente.
Segundo a proposta, o catálogo deverá ser regulamentado e fiscalizado pela Ancine. O projeto prevê que lista de conteúdo com:
- 2.000 obras tenham no mínimo 100 conteúdos audiovisuais brasileiros.
- 3.000 obras: ao menos 150.
- 4.000: no mínimo 200.
- 5.000: ao menos 250.
- 7.000: pelo menos 300.
O texto ainda prevê categorias de cobrança da Condecine. A proposta estabelece que plataformas com faturamento anual acima de R$ 96 milhões pagarão 3% da contribuição. Para empresas com receita entre R$ 4,8 milhões e R$ 96 milhões, a alíquota será de 1,5%. Não haverá cobrança para faturamentos abaixo de R$ 4,8 milhões.
Comentários