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Orgasmo feminino: saiba como funciona e dicas para alcançar o prazer

 Falar sobre orgasmo, prazer, libido e, principalmente, sexo é falar sobre saúde mental. Claro que a relação entre a prática sexual e a qualidade de vida, especialmente em propagandas de ejaculação precoce ou impotência sexual masculina, já é abordada há tempos. Mas e para as mulheres? “É muito difícil falar sobre o orgasmo, pois a maioria foi muito reprimida ao longo da vida inteira com frases como ‘isso é feio’, ‘isso não é coisa de mulher certa’”, diz a educadora sexual Luana Lumertz.

Muito além da falta de educação sexual, a condenação do prazer e da masturbação feminina – muitas vezes, movida por questões religiosas –, é permeada por diversos tabus e traumas que acabam vindo à tona durante um momento tão íntimo. “As pessoas fazem sexo, muitas vezes, no automatismo e aprendem que o papel do ato é dar prazer para o outro, especialmente no universo feminino”, afirma a psiquiatra e sexóloga Juliana Alves. “O sexo, então, deixa de ser para si.”

“Quando era mais jovem, eu tinha muitas questões com meu corpo e isso acabava atrapalhando, porque em vez de estar concentrada em sentir prazer, eu estava pensando na minha barriga ou na celulite ou qualquer outra ‘noia’ que a gente acaba criando”, exemplifica a empresária e criadora de conteúdo Laís Conter, de 34 anos.

Com tanta coisa acontecendo na hora do ato, é difícil se permitir e se entregar ao prazer. E a conversa, seja por medo ou por vergonha, vira coisa rara até entre os parceiros. Nessa atmosfera, a pesquisa Mosaico 2.0, feita pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, em 2016, revelou que 44,4% das mulheres brasileiras têm dificuldades de chegar ao orgasmo intenso; mais de 50% das entrevistadas dizem não se masturbar. “Importante lembrar que a falta de orgasmo feminino está atrelada às disfunções sexuais masculinas. Afinal, ele não dá o tempo e o estímulo necessário para que ela tenha o orgasmo”, esclarece Carmita Abdo, coordenadora da pesquisa e do programa de estudos em sexualidade da USP.

Não houve novas análises com essa abrangência, mas estudos menores indicam que a porcentagem é parecida nos dias atuais. “É realmente muito importante que se comece a entender a sexualidade feminina como específica e particularizada”, orienta Carmita. Segundo ela, muitas vezes a mulher finge o orgasmo para que o homem não sinta sua masculinidade atingida.

De acordo com ela, a mulher conhece muito pouco a própria anatomia genital. “Ela não se permite ter esse contato íntimo com o seu corpo, como se aquela área fosse algo intocável, como se não tivesse ao alcance dela”, observa. No entanto, é essa intimidade que permite ter conhecimento dos próprios prazeres e autonomia para chegar ao clímax.

“Existe uma correlação direta entre o autoconhecimento e a maior taxa de satisfação sexual de orgasmo”, avalia a ginecologista Brunely Galvão. Sem julgamentos ou preocupações com outra pessoa, o prazer é facilitado. Além disso, com a prática, a pessoa consegue entender do que gosta ou não, o que, consequentemente, facilita as futuras relações sexuais. Afinal, sem conhecer a própria corporeidade e o próprio orgasmo, como saber o que se está buscando?

“Se a pessoa nunca chegou ao orgasmo sozinha, dificilmente ela vai conseguir com outra pessoa. É preciso entender onde ela gosta de ser tocada, com que velocidade, pressão e intensidade, quais outras partes do corpo têm estímulos. Há pessoas que são mais sensíveis e outras que são menos. Então, envolve esse descobrimento”, ressalta Luana.

Depois de ter aceitado o seu corpo e de entender como sente o prazer, tirando o medo e a culpa que carregava, Laís afirma que sente liberdade no sexo. “É um sentimento de autonomia do meu próprio prazer”, revela. O processo foi longo, mas hoje ela faz questão de falar sobre sexualidade em suas redes sociais e ajudar outras mulheres a discutirem sobre seus medos e desejos.

Uma das questões mais abordadas por ela é a descentralização da mulher do lugar de reprodutora para o de protagonista, no qual o orgasmo não é algo secundário. “Eu percebi que existe muito essa lacuna de ter alguém próximo para que você consiga perguntar coisas que podem parecer idiotas ou bobas, mas que não são. Todas as perguntas são válidas”, afirma.

Na maioria das escolas, as aulas de sexualidade abordam os assuntos de menstruação e reprodução sexual, mas dificilmente pautas como prazer, preliminares ou masturbação são exploradas. Sem lugar para dúvidas ao longo da puberdade, os jovens recorrem ao que é encontrado com facilidade na internet: conteúdo pornográfico.

“A comparação vem justamente do tabu de não falar sobre sexualidade, inclusive com a gente mesmo. Achamos que é preciso atingir uma performance ou fazer tal posição porque todo mundo faz e segue os exemplos que achamos por aí”, informa Juliana.

No caso das mulheres, a comparação da performance vem junto com a comparação dos corpos e até mesmo das partes íntimas expostas. “O Brasil é um dos países campeões em cirurgias estéticas, incluindo cirurgia íntima. Mas é preciso naturalizar, especialmente entre mulheres mais velhas, a vulva ter pelo ou menos pelo, ter um lábio interno mais proeminente ou não. O importante é que isso não cause dor e desconforto”, explica a ginecologista.

Para a produtora Gabriela Garcia, de 33 anos, é difícil falar de libertação sexual diante desse cenário. “O que é oferecido para nós como referência de sexualidade – e não só o pornô, mas qualquer tipo de entretenimento – não fala sobre comunicação das relações, sobre camisinha, sobre sexo oral, além de sempre serem expostos com corpos-padrão.”

Nascida em uma família bem religiosa, ela nunca pôde falar sobre questões relacionadas à prática sexual com a família, que dirá sobre prazer. “Eu fui criada para casar, ter filhos, como se o sexo nunca fosse o centro, mas sim algo que a gente nunca falava, sempre ligado ao errado”, conta.

Sem saber ao certo o que fazer com a sua vida sexual, ela engravidou da primeira pessoa com que se relacionou sexualmente. “Foi quando eu comecei a me dar conta da importância de falar sobre sexualidade.”

A educadora sexual Luana também percebe essa demanda de instrução em seu sex shop, que abriu aos 20 anos com a mãe. “Muitas das pessoas que aparecem lá estão tendo seus primeiros orgasmos ou estão tendo esse primeiro contato íntimo. Então, além de acolher, eu também sempre tenho parcerias com terapeutas e com fisioterapeutas pélvicas para a gente poder encaminhá-las”, avisa.

De acordo com ela, 80% das mulheres não têm orgasmo somente com penetração, sendo o estímulo clitoriano necessário. Além disso, é preciso muito estímulo mental, afinal a sexualidade da mulher não é linear. “A mulher tem um aspecto diferente do homem, no qual o tesão vai e volta, então às vezes ela está quase chegando ao orgasmo, mas aí ela lembra de alguma preocupação”, explica. Ou seja, a sobrecarga mental da mulher, seja com o acúmulo de tarefas domésticas, problemas com filhos, tripla jornada, podem influenciar – e muito.

No entanto, também existem disfunções relacionadas ao orgasmo para pessoas que têm vagina. “Você pode ter uma dificuldade de chegar lá, um atraso ou até a ausência completa dele, que é a anorgasmia”, analisa a ginecologista. Em relação à libido (desejo), é diferente. “A gente não tem um parâmetro de número de vezes por semana que seja considerado normal aquela pessoa ter desejo. Mas querer estar presente naquele momento é essencial. Quando não está presente a gente classifica em causas orgânicas, uma medicação, por exemplo, ou questões psicológicas, que podem envolver ansiedade, depressão”, adianta.

A prática de exercício físico, alimentação e estresse também podem influenciar o desejo. Claro que ele não é espontâneo 24 horas, a vida inteira, mas caso seja algo que você está forçando para funcionar, talvez a resposta seja procurar ajuda. “Há algumas coisas que a gente não controla, mas dentro do possível o sexo não é para doer – nem mentalmente nem fisicamente. Se você estiver lubrificada, à vontade, em um ambiente que tem privacidade, é para dar tudo certo”, explica Brunely.

Mas afinal, o que é orgasmo? Ela conta que foi durante a adolescência entrou em contato pela primeira vez com o conceito de orgasmo, um ápice de prazer que dura poucos segundos. “Foi então que percebi que eu já havia sentido essa sensação”, conta a bióloga e educadora menstrual Victoria de Castro, de 27 anos.

“Nas revistas de adolescente dos anos 2000, pouquíssimo se falava sobre o orgasmo feminino ou sobre o prazer feminino. A maioria era voltada para o homem e boa parte das informações que eu tive nesse sentido era de conhecimento científico”, recorda ela, que hoje, por falar sobre sexualidade em seu Instagram, escuta várias queixas de mulheres nessa área.

“Muitas mulheres já choraram comigo por perceberem tudo de errado que já falaram para elas ou as referências erradas que elas tinham”, declara. “Muitas duvidaram que tivessem tido um orgasmo, porque não saía líquido, por exemplo. Afinal, temos o referencial do pênis.”

O orgasmo é simplesmente uma sensação que pode ter diversas intensidades. Pode ser que um dia ele seja mais intenso e duradouro e, em outro, mais curto. Tudo vai depender do estímulo, do seu relaxamento e do seu corpo. Ou seja, a sensação divina que falam pode não necessariamente acontecer, ou ser rápida demais, mas os benefícios que ela traz são gigantes.

“A gente libera vários mensageiros químicos, como endorfina, dopamina, ocitocina e eles vão atuar nesse movimento gerando prazer e bom humor. Além disso, o relaxamento que vem depois é como se você fizesse um exercício muito prazeroso, o que fortalece o sistema imunológico, ajuda a dormir um pouco melhor e até auxilia no alívio da dor e da irritabilidade”, completa Brunely.

Diferentemente dos homens, as mulheres não têm um período refratário (espécie de esgotamento corporal), o que permite o surgimento de orgasmos múltiplos, mas também possibilita que elas se sintam mais dispostas e energizadas para terminar tarefas. “Isso sem falar da melhora da autoestima, porque você vê que o seu corpo pode te proporcionar prazer. Você se sente mais confiante”, acrescenta Luana.

Para ter repertório sexual é preciso explorar todas as áreas do corpo e, assim, descobrir outras áreas erógenas. Audição, tato e paladar são importantes. A psiquiatra a e sexóloga Juliana Alves recomenda busca ativa pelo conhecimento. “Descubra o que faz sentido pra você nesse momento e o resto vai ser consequência”, diz ela.

Da mesma forma, observe seu corpo para amar aquilo que você considera defeituoso ou errado. Normalize esse olhar e valorize o que você já ama. “O espelho é uma ótima dica para a pessoa ter aquele primeiro contato e lembrar de relaxar. Crie uma rotina para isso, com a correria do dia a dia, a gente esquece. Tenha esse tempo para si mesma”, incentiva a educadora sexual Luana Lumertz.

Diversas páginas no Instagram se empenham em mostrar, com leveza, o lado real da sexualidade, sem as referências de corpos ultrassexualizados ou pornográficas, expondo vulvas normais, tratando de possíveis medos. Além das mulheres citadas nesta reportagem, perfis como @the.vulva.gallery e @prazerobvious e @prazerela são ótimos caminhos.

Seja você mesma, com as amigas ou com o parceiro. A conversa sobre o prazer deve começar a existir para que ela seja mais fácil e espontânea. Quanto mais se fala sobre o assunto, menos tabus e estigmas existem. Para isso, se desprenda das amarras sociais e se pergunte o que lhe dá prazer. Se há respeito aos limites dos envolvidos, é válido.

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