A empresa oferece ao funcionário a possibilidade de trabalhar em casa e logo a cabeça dele se enche de dúvidas. Nada mais natural e positivo. Questionamentos são bastante pertinentes neste momento, tanto para o empregado como para o empregador, porque nem todas as pessoas possuem o perfil para este estilo de trabalho.
O candidato a home officer ou teletrabalhador precisar ter, para começo de conversa, três qualidades: disciplina, concentração e organização. Também não pode ser muito extrovertido, nem muito introvertido.
“A pessoa tem que estar muito bem consigo mesma. Se for muito extrovertida, vai sempre precisar daquele momento do ‘cafezinho’. Se for introvertida, pode se sentir deprimida”, explica o publicitário André Brik, que adotou o home office em 2003 e é autor do livro “As 100 dicas do Home Office”.
A jornalista Marina Sell Brik, esposa de André e coautora das “100 dicas”, atenta para outro item essencial: a noção de gerenciamento. “Tem que se tentar trabalhar em casa e não morar no escritório. O trabalho não pode invadir o espaço do casal, da família”, afirma ela, que também alerta para o perigo da “invasão” contrária, a da família no espaço do escritório.
Filhos pequenos
Casada e mãe de duas crianças pequenas, Christiana Cardoso Martins levou tudo isso em consideração antes de começar a trabalhar em casa, em janeiro. Funcionária do departamento de Comunicação e Marketing da IBM, no Rio de Janeiro, ela achou que este seria um bom momento na sua vida para optar pelo home office – uma política global da empresa que foi implementada no Brasil em 2005 – e solicitou sua inclusão no programa.
Primeiro, conversou com a gerente, para verificar aptidões pessoais e profissionais e a possibilidade de as suas atividades serem exercidas fora da empresa. Feito isso, foi a vez de acertar os ponteiros com a família. O marido, que é engenheiro, a apoiou e ajudou na montagem do escritório, que ocupa o quarto que era da filha, de 2 anos – agora, a menina divide quarto com o irmão, de 5. E ambos foram instruídos a respeitar o espaço de trabalho da mãe. “Quando a porta está fechada, eles sabem que não podem entrar”, conta Christiana.
Hoje ela consegue levar e buscar as crianças na escola todos os dias e economiza ao menos 80 minutos diários que costumava gastar no percurso de ida e volta à sede da empresa. E para não se sentir desenturmada, uma vez por semana vai até a IBM para alguma reunião ou almoço.
Quando quer e precisa
A gerente de Diversidade e Inclusão da IBM, Eliane Ranieri, explica que o programa de home office é aplicado em duas situações: quando há uma necessidade de negócio da empresa e quando o funcionário pede, visando integrar a vida pessoal à profissional. A IBM fornece o mobiliário para o escritório e reembolsa gastos com papel, toner, impressora, telefone, entre outros.
Eliane diz que existe um aditamento no contrato de trabalho, estabelecendo a nova forma de exercício da atividade, e que as horas extras são reportadas pelo funcionário diretamente ao gerente. “A gente trabalha dentro do conceito de confiança. Não existe nenhuma maneira de comprovar se (o funcionário) estava logado ou não”, explica a gerente.
De acordo com André Brik, a conduta da IBM é próxima da que a maioria das empresas adota. Quanto ao suporte, ele diz que varia de caso para caso. “É um combinado da empresa com o funcionário. Na maioria dos casos a empresa dá computador, mas algumas só elegem quem já tem computador”, exemplifica.
Leis do trabalho
Quanto à questão trabalhista, as empresas estão cientes, mais do que nunca, de que o home officer possui os mesmos direitos de que quando cumpria jornada dentro da empresa. Isso ficou assegurado em dezembro do ano passado com a aprovação da Lei 12.551, que modificou o artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e pela qual “não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado à distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de trabalho”.
O artigo ganhou ainda um parágrafo único, que dita que “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio”. Mas sua interpretação tem gerado muita discussão, já que não fica claro se pode se encaixar em horas extras, por exemplo, os atendimentos a telefonemas ou respostas a e-mails da chefia fora do expediente.
De qualquer forma, a lei foi apresentada pelo governo federal porque o número de empresas adeptas do home office só tem aumentado. Pesquisa realizada pela consultoria HAYS Human Resources no final do ano passado – com questionário enviado ao mailing de clientes da HAYS Brasil -, mostra que 31,2% das empresas brasileiras já adotam o sistema de home office e que, dentre as principais razões apontadas pelas companhias, a preocupação em garantir a retenção de talentos e oferecer melhor qualidade de vida aos funcionários apareceu em 72,7% das respostas.
“A proposta garante ao profissional conciliar de maneira mais fácil as obrigações familiar e a profissional, de modo que ele consiga ir a uma reunião escolar, ao médico, ao banco, entre outras atividades cotidianas, sem que precise faltar no emprego ou chegar atrasado. Isso porque ele pode utilizar o tempo que gastaria no trânsito se deslocando de casa para o trabalho. Menos cansado e com menos conflitos pessoais, o profissional se torna mais produtivo e satisfeito”, analisa André Magro, gerente da área de expertise da HAYS.
E diante de tudo isso, se o funcionário avaliar que não possui o perfil de home officer, mesmo assim é recomendável tentar. “O ganho é tão grande que vale a pena a busca dessa competência”, finaliza o autor das “100 dicas”.
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