Terapias com canto e música aliviam tensões físicas e emocionais e contribuem com o tratamento de diversas doenças
Há apenas 15 anos, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu a importância de inserir a musicoterapia nos centros multidisciplinares de saúde. Contudo, há séculos a música é utilizada com fins restauradores pelo homem.
Um dos registros mais antigos sobre o uso da técnica foi deixado pelo médico e filósofo persa Avicena (980-1031), que prescrevia canções, além de opiáceos, para aliviar a dor. Atualmente, há clínicas integralmente dedicadas ao método, além de hospitais que adotam, além da musicoterapia, a cantoterapia.
Segundo Meca Vargas, fundadora, coordenadora e docente do Antropomúsica, curso de formação em música com viés pedagógico e terapêutico, a técnica ajuda em casos de reumatismo, Parkinson, fibromialgia, esclerose múltipla, disfunções vocais e de fala, depressão, insônia, pânico, problemas respiratórios, entre outras disfunções.
Segundo a terapeuta, o efeito no organismo se dá pela vibração do som, que “desbloqueia o sistema nervoso, ativa o sistema glandular, leva ritmo ao sistema cardiopulmonar, libera tensões musculares e coloca em movimento o sistema metabólico-locomotor”.
Ação global
As reações são psicofisiológicas, como define Sheila Volpi, vice-coordenadora do curso de Musicoterapia da Faculdade de Artes do Paraná (FAP). “É comum associar a música somente ao sentido da audição, mas ela também é percebida pelo sistema tátil. Ao ser captada pelo corpo, provoca efeitos de natureza biológica e emocional, além de movimentos corporais”, diz.
Maristela Smith, fundadora e coordenadora dos cursos de graduação e pós-graduação em Musicoterapia e da Clínica-Escola das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), acrescenta que a técnica ainda estimula centros nervosos e proporciona um aumento nos níveis de neurotransmissores responsáveis pelo equilíbrio.
No consultório mantido pela FMU, são tratadas pessoas com problemas de comunicação e de relacionamento, além de portadores de patologias neurológicas. Segundo a especialista, além destas aplicações, também se nota um grande interesse por parte de hospitais e clínicas odontológicas em adotar o tratamento para diminuir a dor e o grau de estresse pós-cirúrgico.
Podem ser tratados casos como depressão, insônia e pânico, entre outras disfunções
Tratamento técnico e personalizado
Mesmo quem não apresenta qualquer disfunção pode fazer uso da terapia, que, nesses casos, assume uma função preventiva. Luisiana Passarini, do Centro de Musicoterapia Benenzon Brasil, cita, entre os benefícios, o fortalecimento do vínculo afetivo entre mães (incluindo gestantes) e bebês e a promoção do autoconhecimento entre adultos.
Seja qual for a indicação, cada caso envolve uma prescrição específica de melodias, escolhidas conforme o tratamento a ser realizado e as características físicas, mentais e sociais do paciente. Esse histórico também abrange o contexto cultural em que o indivíduo cresceu e vive atualmente, como ressalta Vargas. O mesmo procedimento vale para os trabalhos em grupo.
Não há restrição de estilos ou gêneros. O importante é que a música atue como um meio de transformação e jamais reforce a patologia. No caso da cantoterapia e das sessões que envolvem o uso de instrumentos sonoros, a composição também deve ser de fácil execução. “Nas ocasiões em que é priorizada a audição, pode-se usar um CD com orquestrações mais complexas”, complementa a especialista, que também é regente, cantora e violinista.
Como o trabalho é conduzido
Em média, as sessões duram entre uma hora e uma hora e meia. A sequência das ações depende de cada caso. “O paciente psiquiátrico, por exemplo, é recebido com um diálogo sobre as atividades da semana e, depois disso, realiza algumas atividades de motricidade, coordenação, pulso, respiração e concentração, entre outros”, esclarece.
Cumprida essa etapa, ele então é levado a se expressar por meio do canto ou dos instrumentos à disposição. Os portadores de patologias respiratórias, por sua vez, têm uma terapia mais focada em exercícios que trabalham especificamente o sistema respiratório.
Passarini ressalta que o tratamento pode ainda ser empregado em pacientes em coma. Reações como suor, ruborização da pele e arrepios são alguns dos parâmetros usados pelos profissionais para conduzir a sessão.
Indicações e acompanhamento
Em geral, Vargas afirma que são necessárias 12 sessões para que o indivíduo “mergulhe” na terapia e extraia dela uma parcela maior de benefícios. Apesar disso, a resposta dos pacientes ao tratamento varia de caso para caso.
“O terapeuta deve estar atento ao processo para perceber a evolução da pessoa e os limites de sua atuação. A alta é dada quando um estágio satisfatório é alcançado ou quando surge a necessidade de buscar outro caminho”, afirma. Outra possibilidade é seguir com o tratamento visando manter a qualidade de vida, como afirma Passarini.
Para acompanhar o quadro, o especialista pode ainda contar com o apoio de familiares e de médicos envolvidos no tratamento. Smith explica que, na Clínica-Escola da FMU, há muitos encaminhamentos de neurologistas e psiquiatras, além de psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e enfermeiros.
Em outros casos, o trabalho multidisciplinar é feito em conjunto, no mesmo local. Passarini informa que os profissionais do instituto atuam em prontos-socorros infantis e Unidades de Terapias Intensivas (UTI) de hospitais de São Paulo.
Prática cotidiana x terapia
No cotidiano, o simples ato de ouvir músicas, cantar e tocar instrumentos pode proporcionar bem-estar para o organismo. Porém, os especialistas ressaltam que para que seja estabelecido um trabalho terapêutico, a presença de um profissional habilitado é fundamental.
“É preciso ter conhecimentos que possibilitem compreender os processos psíquicos, emocionais, físicos, biológicos, grupais que se apresentam durante as sessões”, finaliza Volpi.
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