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O que pode acontecer se o governo descumprir a meta de zerar o déficit fiscal no ano que vem?

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, na sexta-feira, 27, que o governo “dificilmente” cumprirá a meta fiscal de déficit zero em 2024. A meta teve suas regras estabelecidas no arcabouço fiscal e consta no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para 2024, em tramitação no Congresso Nacional.

Sancionado em 31 de agosto deste ano, o arcabouço fiscal, nova regra para controle das contas públicas, substituiu o teto de gastos com regras mais flexíveis, ao permitir que as despesas cresçam acima da inflação, desde que num ritmo inferior ao aumento de receitas.

O objetivo do novo regime fiscal, segundo o governo, é garantir um equilíbrio entre a arrecadação e os gastos, para que as contas públicas voltem a ficar “no azul”. A meta do Ministério da Fazenda é zerar o balanço em 2024 e registrar superávit (saldo positivo) a partir de 2025.

Uma meta fiscal igual a zero é quando as receitas menos as despesas equivalem a zero, sem considerar o pagamento dos juros da dívida. Para isso acontecer, o governo federal precisaria arrecadar R$ 168,5 bilhões adicionais no ano que vem.

De acordo com as regras do arcabouço, o resultado primário (o saldo entre as receitas e despesas, sem considerar gastos com juros da dívida) das contas públicas terão um intervalo (banda) de tolerância. Esse limite é de 0,25 ponto porcentual do PIB para mais ou para menos. Se a meta é obter um superávit de 0,5% do PIB, por exemplo, como é esperado pela Fazenda para 2025, o resultado poderia ficar, portanto, no intervalo de 0,25% a 0,75%.

No caso da meta de 2024, que é a de zerar o déficit fiscal, caso fique dentro da banda inferior, o governo poderia apresentar um rombo de até R$ 28,6 bilhões no ano que vem para cumprir a meta fiscal, de acordo com cálculos da Instituição Fiscal Independente do Senado.

Lula disse que, para ter um déficit zero nas contas públicas, o País precisará fazer cortes de investimentos. “Dificilmente chegaremos à meta zero, até porque não queremos fazer corte de investimentos e de obras”, afirmou.

A mudança da meta fiscal virou um cabo de guerra no governo. O Estadão mostrou que os ministros Rui Costa (Casa Civil), Simone Tebet (Planejamento) e Esther Dweck (Gestão) chegaram a defender internamente uma meta menor, mas Haddad não concordou, sob a justificativa de que esse recuo seria visto como fragilidade.

Questionado por jornalistas na segunda-feira, 30, Haddad se negou a cravar se a meta de déficit zero para 2024 estaria mantida, limitando-se a dizer: “A minha meta está estabelecida. Eu vou buscar o equilíbrio fiscal de todas as formas justas e necessárias para que nós tenhamos um país melhor”, afirmou o ministro.

Está em discussão a possibilidade de uma meta mais flexível do que a inicialmente proposta pelo Ministério da Fazenda. Como mostrou o Estadão, o cenário de hoje dentro do governo está mais para mudar do que para manter a meta fiscal de zerar o déficit no ano que vem.

Isso porque o governo Lula não quer correr o risco de ter de bloquear investimentos no ano que vem caso a pauta de medidas arrecadatórias não avance no Congresso. Em reunião com líderes na terça, 31, o presidente disse que não cortará nem uma vírgula do Orçamento de 2024. Na saída da reunião, o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) disse que o plano do governo de zerar o déficit depende das medidas de aumento de arrecadação.

A mudança para um déficit em torno de 0,5% do PIB permitiria evitar a necessidade de um bloqueio de R$ 53 bilhões em despesas no ano que vem, que é o máximo permitido pelo arcabouço com base nos dados do Orçamento de 2024 enviado pelo governo.

Marcos Mendes, pesquisador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, afirma que não há garantias de que essa nova meta possa ser também alcançada, já que pode incentivar os pleitos políticos por aumento de gastos. “Se não houver respaldo político do presidente da República e uma concertação política com o Congresso, a tendência é que novas mudanças de meta venham a ocorrer”, diz.

Para ele, o limite do crescimento da despesa de, no máximo, 2,5% ao ano acima da inflação, estabelecido pelo arcabouço, também é algo que pode, em breve, ficar difícil de cumprir. “Com as decisões do governo de aumentar o salário mínimo e indexar os gastos de saúde e educação à receita, e os aumentos das emendas parlamentares pelo Congresso, em breve esse limite deixará de ser factível, e terá que ser alterado também”, coloca.

Lula pode enviar uma mensagem modificativa da Lei de Diretrizes Orçamentárias alterando a meta até o início da votação do projeto na Comissão Mista de Orçamento (CMO), conforme está estabelecido na Constituição. O governo ainda não cravou se vai mudar a meta fiscal e nem como faria isso. O relator, Danilo Forte, articula para votar o parecer preliminar da LDO, que abrirá o prazo regimental para a apresentação das emendas, ainda nesta semana.

Integrantes do Palácio do Planalto avaliam que o custo político e financeiro seria menor caso a mudança fosse feita já na LDO. Se não enviar a mensagem modificativa a tempo, ainda assim o governo tem a prerrogativa de mudar a meta - mas aí teria de mandar um projeto separado ao Congresso, o que pode ter mais custo político para o governo.

De acordo com o arcabouço fiscal, sempre que o resultado primário crescer dentro da banda estabelecida, no ano seguinte, o crescimento real (acima da inflação) da despesa será igual a 70% do crescimento real da receita primária, acumulada em 12 meses até junho. O aumento de gastos é limitado a um crescimento real da despesa de, no mínimo, 0,6% ao ano e, no máximo, 2,5% ao ano.

No entanto, caso o resultado fique abaixo da banda inferior da meta, o crescimento do teto no ano seguinte ficará limitado a 50% do crescimento da receita, que também fica limitado a um crescimento real mínimo de 0,6% ao ano, e máximo de 2,5% ao ano.

Há, ainda, sanções para o ano seguinte caso o governo não cumpra a meta de resultado primário em exercício: a não concessão de aumento real de despesas obrigatórias, a suspensão de criação de novos cargos públicos e a suspensão da concessão de benefícios acima da inflação

Além disso, com o novo regime fiscal, o contingenciamento, isto é, o bloqueio preventivo de despesas, se tornou obrigatório. O contingenciamento é limitado a 25% de despesas discricionárias (não obrigatórias, como investimentos), a fim de resguardar o funcionamento da máquina pública.

O arcabouço fiscal prevê a possibilidade de rompimento eventual da meta, afirma Salto, “desde que todo o corte de gastos não obrigatórios seja implementado e, ainda assim, não se consiga chegar ao compromisso estipulado”. “Neste caso, há sanções previstas na referida lei complementar, os chamados gatilhos.”

Vale ressaltar, porém, que se o governo alterar a meta - por exemplo, para déficit de 0,5% do PIB -, não sofrerá as sanções por não zerar o déficit em 2024. Ele só sofrerá as sanções previstas no arcabouço caso não atinja o piso da meta estipulada.

Se mantiver a meta zero e entregar um déficit de 0,30% do PIB, por exemplo, será penalizado - uma vez que ultrapassa o piso da meta, que seria um déficit de 0,25%. Agora, se mudar a meta para um rombo de 0,25% do PIB e entregar esse mesmo resultado, de déficit de 0,30%, não haveria sanções, pois o limite seria um déficit de 0,50%, pela margem de tolerância do arcabouço.

Caso se mantenha a meta, é provável que ela seja rompida, diz Felipe Salto, economista-chefe da Warren Rena. A corretora calculou um déficit de 0,74% do PIB para 2024, com pouco mais de R$ 83 bilhões em receitas novas. O valor, no entanto, está bastante aquém do pretendido pelo governo, de mais de R$ 168 bilhões.

Segundo Salto, a mudança da meta fiscal neste momento seria pior do que reforçar o compromisso com ela e eventualmente descumpri-la. “Ao manter a meta zero, pode-se conseguir, como prevemos, um déficit de 0,74% do PIB, menor do que projetamos na Warren Rena para 2023, de 1,1% do PIB, e também menor do que a projeção do próprio governo para 2023, que é 1,3% do PIB. Nesse sentido, o mais adequado é a manutenção da meta”, afirma.

Além disso, com uma dívida maior, emprestar para o governo se torna mais arriscado, e juros mais altos devem se espalhar por toda a economia, o que pode influenciar em menor crescimento econômico, afirma Mendes. “Cresce o risco de a inflação aumentar, de o crescimento econômico cair, de haver pacotes aumentando impostos (e reduzindo a rentabilidade das empresas e a renda das famílias)”.

Até o momento, a proposta de zerar o déficit primário é uma pauta para negociação de projetos, aponta Élida Graziane, procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo. “Não se pode exigir, em 2023, que haja a adoção preventiva de uma série de medidas que somente dizem respeito à execução orçamentária de 2024, exatamente porque nem sequer foi aprovada a LDO correspondente ao próximo exercício”, diz a professora.

O descumprimento da meta já está sendo considerado nas projeções dos especialistas em contas públicas para o ano que vem, segundo Salto. A questão seria, portanto, discutir os impactos de uma possível mudança da meta.

Para Salto, o fundamental é melhorar o déficit primário de um ano para outro e manter o arcabouço. Nesse contexto, alterar a meta seria muito negativo porque abriria espaço para “aumento do risco, desconfiança e atrapalharia, sem dúvida, o trabalho do Banco Central, que, neste momento, opera uma redução de juros básicos”, diz o especialista.

O especialista afirma que o mais importante é cumprir o arcabouço fiscal, já que não se vê a meta sendo cumprida. Nesse caso, a Warren prevê um cenário de melhora paulatina ao longo dos anos do déficit primário.

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