À primeira vista, Michel Lenz Cesar Calmanowitz é um jovem de 20 anos igual aos outros. Tem cabelo curtinho, na moda, usa óculos, o rosto exibe marcas de espinha. O pai, terapeuta corporal, e a mãe, psicóloga, são separados. As semelhanças com um garoto comum talvez terminem aí. Desde os 12 anos, ele vive no monastério de Sera Me, na Índia, entre 4 000 monges. Lama Michel Rimpoche ("o precioso", em tibetano) dedica sua vida a estudar e a divulgar o Budismo.
Quando criança, numa viagem à Índia com a família, ele foi reconhecido por outros lamas como reencarnação de vários mestres um deles, do século XV. Junto com seu tutor, o lama Gangchen, Michel viaja o mundo divulgando a palavra de Buda.
Como é o dia-a-dia de um brasileiro de 20 anos em um monastério budista?
Vivo em uma universidade monástica com outros 4 000 monges. Sou o único ocidental da minha faculdade, que tem 1 500 alunos. Moramos numa pequena cidade no interior da Índia, ao sul. Um lugar quente. Meu cotidiano é todo baseado nos estudos do Budismo. Acordo entre 5 e 6 horas da manhã e faço minhas rezas; depois realizo exercícios de memorização de orações. Tomo café da manhã, que tem chá com leite e pão com geléia, e varro meu quarto. Em seguida, temos leitura até as 9 horas. Às 11 horas, começa uma rodada de debates na minha classe. São 68 pessoas. Às onze e meia almoçamos e, então, vamos para a siesta. Depois das 14 horas, temos leitura até as 17, quando jantamos. Das 18 às 21 horas, há outra sessão de debate - que pode se prolongar até as 23 horas. As terças-feiras são livres.
Você foi reconhecido como reencarnação de lamas tibetanos. Como foi?
Eu tinha 8 anos. Estava numa peregrinação pela Índia com meu pai, minha mãe, minha irmã e o lama Gangchen Rimpoche. Eram três meses de viagem por lugares sagrados, onde Buda esteve. Encontramos vários mestres que disseram todos a mesma coisa: eu era a reencarnação de um lama o que se chama, em tibetano, um tulku. Bem, depois disso minha vida transcorreu normalmente. No ano seguinte, fomos ao Tibete e outros mestres repetiram aquela história. Quando completei 12 anos, comecei a ficar insatisfeito com a vida que levava. Mais que isso, com a vida que eu iria levar. Cursar uma universidade, ter um diploma, achar um bom trabalho, faturar dinheiro, criar uma família e... o que mais? Eu via pessoas à minha volta com um ótimo emprego, um ótimo carro, enfim, tudo o que queriam - e elas nunca estavam felizes. Por outro lado, enxergava no lama Gangchen um exemplo de felicidade. Sempre satisfeito, ainda que não possuísse nada do que a sociedade mandava. Pensei: "Quero ser assim". Foi o que me levou ao Budismo.
Quando revê velhos amigos cheios de planos, carro novo, namorada, você se pergunta se fez a coisa certa?
Eu fiz a minha escolha. Meus amigos também estão procurando a felicidade, à maneira deles. Sinto-me realizado com o caminho que tomei.
Você é virgem e fez voto de castidade. Nunca sonhou ter uma garota?
Não. Como lama, estou numa posição em que as pessoas vêm a mim contar suas dificuldades. Noventa por cento delas são causadas por relacionamentos. Não preciso passar por tudo isso para saber como é. Não tenho problema nenhum em ver mulher pelada em outdoors ou na TV. O ponto é: o que faço precisa ter um significado. Quando vejo garotos e garotas indo a boates, a bares, não consigo enxergar significado naquilo. Claro, se vivesse numa cidade como São Paulo, seria muito mais difícil tomar essa atitude. Sou humano, como qualquer um.
Existe uma arte da felicidade, como diz o título de um livro do Dalai Lama?
Há um caminho para ser feliz. Buda diz: "Deixe de lado as ações negativas, concentre-se em ações positivas, controle sua mente". Negativo é o que fazemos baseados na raiva, no apego, no ciúme, no orgulho, na avareza, no desejo, na insatisfação... enfim, todos os chamados "venenos mentais". As ações positivas são exercidas com compaixão, paciência, humildade, sabedoria e amor - lembrando que amor é a vontade que o outro seja feliz, não importa onde, como, quando e com quem. Para isso, precisamos controlar nossa mente. E como controlar a mente? Com a meditação.
De que maneira a prática da meditação pode ajudar as pessoas?
Em tibetano, a palavra para meditação é gom, que significa habituar, familiarizar. Ou seja, é preciso familiarizar a mente com algo positivo. Em geral, a mente se acostuma facilmente com as coisas. Por exemplo: começamos a nutrir uma imagem ruim de uma pessoa e, de repente, ela se torna realmente ruim. Isso acontece muito. A mente se acostuma com o que é bom e com o que é mau. Se dedicarmos parte do tempo, dez minutos que sejam, a pensar no amor, podemos alterar nossa forma de comportamento.
O que é mais difícil: mudar o mundo ou mudar a si mesmo?
Não dá para mudar o mundo. O único ser humano que você pode mudar é você mesmo. Podemos ajudar outros a mudarem, mostrar o caminho, mas não dá para andar por ninguém.
Você crê, realmente, que seja a reencarnação de alguém?
O que se leva de uma vida para a outra é o chamado "contínuo mental" ou "mente sutil", algo que pode ser definido como o conjunto das qualidades interiores que tenhamos desenvolvido. Não levaremos o Porsche, a cobertura ou a conta na Suíça. Acredito que trago uma velha bagagem do Budismo. Foi o que aqueles monges viram em mim quando criança. Sou a reencarnação de vários lamas. Um do século XV, outros que morreram há pouco tempo. Tem gente que os conheceu, mas nunca perguntei a ninguém como eles eram. Buda diz: "Se você quer saber o que fez no passado, olhe o que faz no presente".
Quando criança, numa viagem à Índia com a família, ele foi reconhecido por outros lamas como reencarnação de vários mestres um deles, do século XV. Junto com seu tutor, o lama Gangchen, Michel viaja o mundo divulgando a palavra de Buda.
Como é o dia-a-dia de um brasileiro de 20 anos em um monastério budista?
Vivo em uma universidade monástica com outros 4 000 monges. Sou o único ocidental da minha faculdade, que tem 1 500 alunos. Moramos numa pequena cidade no interior da Índia, ao sul. Um lugar quente. Meu cotidiano é todo baseado nos estudos do Budismo. Acordo entre 5 e 6 horas da manhã e faço minhas rezas; depois realizo exercícios de memorização de orações. Tomo café da manhã, que tem chá com leite e pão com geléia, e varro meu quarto. Em seguida, temos leitura até as 9 horas. Às 11 horas, começa uma rodada de debates na minha classe. São 68 pessoas. Às onze e meia almoçamos e, então, vamos para a siesta. Depois das 14 horas, temos leitura até as 17, quando jantamos. Das 18 às 21 horas, há outra sessão de debate - que pode se prolongar até as 23 horas. As terças-feiras são livres.
Você foi reconhecido como reencarnação de lamas tibetanos. Como foi?
Eu tinha 8 anos. Estava numa peregrinação pela Índia com meu pai, minha mãe, minha irmã e o lama Gangchen Rimpoche. Eram três meses de viagem por lugares sagrados, onde Buda esteve. Encontramos vários mestres que disseram todos a mesma coisa: eu era a reencarnação de um lama o que se chama, em tibetano, um tulku. Bem, depois disso minha vida transcorreu normalmente. No ano seguinte, fomos ao Tibete e outros mestres repetiram aquela história. Quando completei 12 anos, comecei a ficar insatisfeito com a vida que levava. Mais que isso, com a vida que eu iria levar. Cursar uma universidade, ter um diploma, achar um bom trabalho, faturar dinheiro, criar uma família e... o que mais? Eu via pessoas à minha volta com um ótimo emprego, um ótimo carro, enfim, tudo o que queriam - e elas nunca estavam felizes. Por outro lado, enxergava no lama Gangchen um exemplo de felicidade. Sempre satisfeito, ainda que não possuísse nada do que a sociedade mandava. Pensei: "Quero ser assim". Foi o que me levou ao Budismo.
Quando revê velhos amigos cheios de planos, carro novo, namorada, você se pergunta se fez a coisa certa?
Eu fiz a minha escolha. Meus amigos também estão procurando a felicidade, à maneira deles. Sinto-me realizado com o caminho que tomei.
Você é virgem e fez voto de castidade. Nunca sonhou ter uma garota?
Não. Como lama, estou numa posição em que as pessoas vêm a mim contar suas dificuldades. Noventa por cento delas são causadas por relacionamentos. Não preciso passar por tudo isso para saber como é. Não tenho problema nenhum em ver mulher pelada em outdoors ou na TV. O ponto é: o que faço precisa ter um significado. Quando vejo garotos e garotas indo a boates, a bares, não consigo enxergar significado naquilo. Claro, se vivesse numa cidade como São Paulo, seria muito mais difícil tomar essa atitude. Sou humano, como qualquer um.
Existe uma arte da felicidade, como diz o título de um livro do Dalai Lama?
Há um caminho para ser feliz. Buda diz: "Deixe de lado as ações negativas, concentre-se em ações positivas, controle sua mente". Negativo é o que fazemos baseados na raiva, no apego, no ciúme, no orgulho, na avareza, no desejo, na insatisfação... enfim, todos os chamados "venenos mentais". As ações positivas são exercidas com compaixão, paciência, humildade, sabedoria e amor - lembrando que amor é a vontade que o outro seja feliz, não importa onde, como, quando e com quem. Para isso, precisamos controlar nossa mente. E como controlar a mente? Com a meditação.
De que maneira a prática da meditação pode ajudar as pessoas?
Em tibetano, a palavra para meditação é gom, que significa habituar, familiarizar. Ou seja, é preciso familiarizar a mente com algo positivo. Em geral, a mente se acostuma facilmente com as coisas. Por exemplo: começamos a nutrir uma imagem ruim de uma pessoa e, de repente, ela se torna realmente ruim. Isso acontece muito. A mente se acostuma com o que é bom e com o que é mau. Se dedicarmos parte do tempo, dez minutos que sejam, a pensar no amor, podemos alterar nossa forma de comportamento.
O que é mais difícil: mudar o mundo ou mudar a si mesmo?
Não dá para mudar o mundo. O único ser humano que você pode mudar é você mesmo. Podemos ajudar outros a mudarem, mostrar o caminho, mas não dá para andar por ninguém.
Você crê, realmente, que seja a reencarnação de alguém?
O que se leva de uma vida para a outra é o chamado "contínuo mental" ou "mente sutil", algo que pode ser definido como o conjunto das qualidades interiores que tenhamos desenvolvido. Não levaremos o Porsche, a cobertura ou a conta na Suíça. Acredito que trago uma velha bagagem do Budismo. Foi o que aqueles monges viram em mim quando criança. Sou a reencarnação de vários lamas. Um do século XV, outros que morreram há pouco tempo. Tem gente que os conheceu, mas nunca perguntei a ninguém como eles eram. Buda diz: "Se você quer saber o que fez no passado, olhe o que faz no presente".
Comentários