NE: O senhor poderia indicar leituras ou caminhos para orientar o professor?
Moura Castro: Esta revista está recheada de boas idéias e leituras. O caminho é por aí: levar o ensino árido, decorado e rasteiro para a direção do ensino reflexivo, que dialogue com o mundo real e seja contextualizado. Não estão em jogo a teoria pedagógica ou o guru de plantão. Interessam, isso sim, maneiras de tornar a sala de aula mais estimulante, intelectualmente mais rica.
NE: Muitos professores se sentem bombardeados por diferentes e sucessivas concepções de bom ensino, como modismos. Eles não sabem, por exemplo, se podem utilizar recursos tradicionais, como o livro didático, o ditado e as aulas expositivas. Em educação, existe consenso entre o que é bom/moderno e o que é
ruim/ultrapassado? É possível afirmar que tal método serve e outro não?
Moura Castro: O bom professor de um século atrás não seria um mau professor hoje. O livro continua tão vigente quanto antes. A aula expositiva não é má em si, mas não pode ser a única atividade. Como parte do ensino, é perfeita. Na minha opinião, porém, só existe um consenso: professor em greve ou ausente é o pior de tudo. O tempo perdido com atividades que não ensinam nada de importante é uma horrível fonte de desperdício. Informação demais impede a profundidade, essencial para que se aprendam lições que vão muito além da decoreba. Há muito modismo, sim. Mas não creio que entre pessoas intelectualmente maduras e conhecedoras do panorama da educação haja tanta discrepância sobre questões de primeira grandeza.
NE: A indisciplina é queixa constante dos professores. Como conquistar autoridade?
Moura Castro: A semente da disciplina ou da indisciplina reside no clima da escola. Se ela não consegue impor seus valores entre alunos e professores, conseguir disciplina passa a ser uma proeza. Isso é muito importante, pois pesquisas recentes mostram que nas escolas em que há mais indisciplina o rendimento acadêmico é pior. Não existe uma fórmula única para a conquista da disciplina, da mesma maneira que os estilos dos professores não são iguais. Dar socos na parede pode ser uma solução para alguns. Eu, por exemplo, tive um que delicadamente depositava um revólver sobre a mesa quando os alunos se agitavam. Era
um santo remédio. Mas longe de mim recomendar uma solução dessas. Lembremo-nos de que a indisciplina viceja quando a motivação dos alunos é menor. Curso interessante e cativante tem menos problemas.
NE: Qual é o problema mais grave da educação brasileira?
Moura Castro: A falta de qualidade do Ensino Fundamental.
NE: E a maior conquista recente?
Moura Castro: Felizmente, os anos iniciais apresentam progressos mais rápidos e expressivos. O aumento do número de alunos que concluem o Ensino Fundamental, e sem queda da qualidade como pode ser medido no Sistema de Avaliação da Educação Básica, o Saeb mostra justamente esse progresso. O avanço gigantesco nos testes de rendimento escolar e a avaliação de instituições, juntamente com a revolução nas estatísticas
educacionais, são também conquistas consideráveis, embora instrumentais. Na verdade, não há outro país no mundo com um sistema de avaliação tão abrangente quanto o brasileiro. Quase todos têm algum teste no primário e no secundário. O exame de saída do secundário, o nosso Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), mais o Provão e a avaliação da pós-graduação nos colocam na dianteira.
NE: O país está preparado para o estrondoso crescimento que se projeta para o Ensino Médio?
Moura Castro: Não. nem sequer temos professores corretamente preparados, sobretudo em Ciências e Matemática, para os alunos que estão matriculados. Espera-se que esse crescimento do número de alunos persista por muitos anos. Se conseguirmos não piorar muito em qualidade, já será um grande sucesso. Passar de um sistema elitista para outro em que bem mais da metade da população entra na escola significa começar
a lidar com uma clientela que tem nível social mais baixo e requer formas diferentes de ensinar. Ainda estamos engatinhando nas soluções para essas questões.
Comentários