Pular para o conteúdo principal

Clodovil, Lula e críticas à Igreja aparecem em "A Escrava Isaura e o Vampiro"

 O que o falecido estilista e deputado Clodovil Hernandes e o presidente Lula têm em comum? Ambos são citados de supetão em "A Escrava Isaura e o Vampiro".

Lançamento do selo Lua de Papel, da editora LeYa, a obra que insere elementos da literatura fantástica ao clássico romântico foi escrita pelo roteirista e humorista Jovane Nunes. Talvez por isso, a principal característica do livro seja justamente a ironia.

Diferente dos outros três volumes da coleção "Clássicos Fantásticos" ("Dom Casmurro e os Discos Voadores""O Alienista Caçador de Mutantes" e "Senhora, A Bruxa"), esta versão do romance de Bernardo Guimarães (1825-1884) conta com um breve e improvável "guia para a leitura".

No trecho que precede a obra, o autor avisa: "o romantismo é o mesmo que o estilista Clodovil Hernandes, com sapatos bicolores e terno bordado em cristais, cantando 'Fascinação' num karaokê da Paulista.". A explicação surge em seguida: "Se a descrição dos lugares e caracteres não estiver suficientemente frufru, desconsidere e pinte você mesmo o quadro. Acrescente, a gosto, muitos adjetivos além dos que coloco. Não existe prosa romântica sem adjetivos."

Por esse excesso de adjetivos e descrições a ironia torna-se presente no subtexto da trama. Um exemplo pode ser conferido no trecho que descreve os efeitos do amanhecer. "Essa aurora matinal traz consigo a entusiástica manhã de um florido dia do suntuoso mês de março no majestoso século XIX."

Outro ponto no qual a ironia apresenta-se no texto está na descrição do personagem Leôncio, onde é possível detectar críticas à Igreja Católica e à atual classe média do país. "O Comendador Leôncio Pai, também conhecido com Senhor de Engenho por engenhar vários golpes, manda vir da Europa, terra onde moram muitos europeus, uns móveis e outros utensílios. Graças a este gesto, o imperador lhe concede um novo título e Leôncio Pai deixa de ser comendador e passa a ser encomendador. O agora encomendador divide o seu precioso tempo entre fazer suas encomendas, a família, a igreja e a prática da pedofilia. Mas isso é outra história. O que diverte a todos nas calorentas tardes campistas é ver Leôncio Pai atirar em mendigo e bater em travesti."

Leia a seguir o primeiro capítulo de "A Escrava Isaura e o Vampiro".

Guia para leitura

O Romantismo na literatura brasileira é aquele movimento que começa em 1836, com o lançamento do livro Suspiros Poéticos e Saudades; e vai até o lançamento de Memórias Póstumas de Brás Cubas, em 1881. É um movimento marcado pelo subjetivismo, escapismo, sentimentalismo exacerbado, vontade de se suicidar e culto à natureza. O índio, o camponês e o escravo, sempre idealizados, eram os heróis e protagonistas dos romances românticos. Isaura, por exemplo, sabia falar francês e tocar piano. O Romantismo era a vontade, o sonho de mundo onde o ideal vence no final. Para entender melhor, o romantismo é o mesmo que o estilista Clodovil Hernandes, com sapatos bicolores e terno bordado em cristais, cantando "Fascinação" num karaokê da Paulista.

Este livro que você está prestes a se aventurar a ler é uma obra romântica, portanto bela. Nas próximas páginas, tudo deverá ser encantador e pueril. Ao ler, tente ouvir a narração pela voz de um locutor de FM, desses que fazem traduções de músicas americanas. Também é preciso dizer que, tratando-se de um livro meigo e, terno, o leitor deixe para depois a curiosidade pornográfica e com o que resta de saudável em sua imaginação, ajude-me na confecção da obra. Se a descrição dos lugares e caracteres não estiver suficientemente frufru, desconsidere e pinte você mesmo o quadro. Acrescente, a gosto, muitos adjetivos além dos que coloco. Não existe prosa romântica sem adjetivos.

Atenção! Vamos começar a narrativa.

Capítulo 1

Nasce o sol, este rebento que é o imperador caloroso de todos os astros. Ao despontar, o mavioso astro rei jorra seus raios como filetes de ouro sobre a casa-grande de uma soberba fazenda. A luz, tal qual a razão quando invade a mente do ignorante, inunda de vida nova o belo jardim repleto de plantas nativas... Não. Repleto de robustas e doces plantas europeias, dessas que sabem até falar francês e não guardam em seu âmago os filhotes do mosquito da dengue. Assim é mais romântico. Essa aurora matinal traz consigo a entusiástica manhã de um florido dia do suntuoso mês de março no majestoso século XIX. Amanhecer que, precisamos dizer, veio antes do meio dia e é o começo de novos e soberbos tempos. Esta bucólica fazenda em questão, situada na zona rural do município de Campos, amável e aprazível Campos, no interior do Rio de Janeiro, é o paradisíaco lugar onde começa a nossa empolgante história. O dono da fazenda e senhor de tudo é Leôncio Pai, pai de Leôncio filho, o popular Rubens de Falco. Leôncio Pai, por ter muito dinheiro e muitos bens, é riquíssimo. Graças ao ciclo econômico do café, do pãozinho francês e da Cleybon Cremosa, Leôncio Pai tornou-se o grande monopolista do desjejum brasileiro. Todos tinham que se submeter às vontades daquele senhor de engenho, caso contrário, ficariam até meio-dia sem comer nada. Lula, séculos depois, ainda lutava contra esse mal que se abateu sobre o impávido Brasil lançando o "Fome Zero", onde pelo qual cada brasileiro deveria comer três vezes ao dia. Ronaldo fenômeno abraçou a causa de Lula com fervor e devoção, às vezes fazendo até sete refeições. O Comendador Leôncio Pai, também conhecido com Senhor de Engenho por engenhar vários golpes, manda vir da Europa, terra onde moram muitos europeus, uns móveis e outros utensílios. Graças a este gesto, o imperador lhe concede um novo título e Leôncio Pai deixa de ser comendador e passa a ser encomendador. O agora encomendador divide o seu precioso tempo entre fazer suas encomendas, a família, a igreja e a prática da pedofilia. Mas isso é outra história. O que diverte a todos nas calorentas tardes campistas é ver Leôncio Pai atirar em mendigo e bater em travesti. Mas, cuidadoso com a criação do filho assim como é com seus nelores, o zeloso Leôncio Pai percebe que falta a Leôncio Filho o arcabouço teórico necessário para que toda a sua canalhice venha à tona. Leôncio Pai, determinado, manda o filho à Europa para tornar-se advogado nos bancos de Coimbra. Pensa: como Advogado, meu filho não será conhecido apenas como Leôncio filho, mas como Leôncio fdp.

"A Escrava Isaura e o Vampiro"
Autor: Jovane Nunes, Bernardo Guimarães
Editora: Lua de Papel
Páginas: 168

Comentários

Postagens Mais Lidas

literatura Canadense

Em seus primórdios, a literatura canadense, em inglês e em francês, buscou narrar a luta dos colonizadores em uma região inóspita. Ao longo do século XX, a industrialização do país e a evolução da sociedade canadense levaram ao aparecimento de uma literatura mais ligada às grandes correntes internacionais. Literatura em língua inglesa. As primeiras obras literárias produzidas no Canadá foram os relatos de exploradores, viajantes e oficiais britânicos, que registravam em cartas, diários e documentos suas impressões sobre as terras da região da Nova Escócia. Frances Brooke, esposa de um capelão, escreveu o primeiro romance em inglês cuja ação transcorre no Canadá, History of Emily Montague (1769). As difíceis condições de vida e a decepção dos colonizadores com um ambiente inóspito, frio e selvagem foram descritas por Susanna Strickland Moodie em Roughing It in the Bush (1852; Dura vida no mato). John Richardson combinou história e romance de aventura em Wacousta (1832), inspirada na re

Chave de Ativação do Nero 8

1K22-0867-0795-66M4-5754-6929-64KM 4C01-K0A2-98M1-25M9-KC67-E276-63K5 EC06-206A-99K5-2527-940M-3227-K7XK 9C00-E0A2-98K1-294K-06XC-MX2C-X988 4C04-5032-9953-2A16-09E3-KC8M-5C80 EC05-E087-9964-2703-05E2-88XA-51EE Elas devem ser inseridas da seguinte maneira: 1 Abra o control center (Inicial/Programas/Nero 8/Nero Toolkit/Nero controlcenter) nunca deixe ele atualizar nada!  2 Clic em: Licença  3 Clica na licença que já esta lá dentro e em remover  4 Clica em adcionar  5 Copie e cole a primeira licença que postei acima e repita com as outras 5

Papel de Parede 4K

Wallpaper 4K (3000x2000)

Como funciona o pensamento conceitual

O pensamento conceitual ou lógico opera de maneira diferente e mesmo oposta à do pensamento mítico. A primeira e fundamental diferença está no fato de que enquanto o pensamento mítico opera por bricolage (associação dos fragmentos heterogêneos), o pensamento conceitual opera por método (procedimento lógico para a articulação racional entre elementos homogêneos). Dessa diferença resultam outras: • um conceito ou uma idéia não é uma imagem nem um símbolo, mas uma descrição e uma explicação da essência ou natureza própria de um ser, referindo-se a esse ser e somente a ele; • um conceito ou uma idéia não são substitutos para as coisas, mas a compreensão intelectual delas; • um conceito ou uma idéia não são formas de participação ou de relação de nosso espírito em outra realidade, mas são resultado de uma análise ou de uma síntese dos dados da realidade ou do próprio pensamento; • um juízo e um raciocínio não permanecem no nível da experiência, nem organizam a experiência nela mesma, mas, p

Luto! (25/12/1944 - 17/10/2022)