‘Quanto maior é o imposto nos setores muito competitivos, mais aumenta a sonegação’, diz CEO da Petz
Sergio Zimerman, fundador e CEO da Petz e membro do Conselho do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV), diz estar descontente com a reforma tributária que será votada no Senado. “Começou a aparecer o manicômio (tributário) de novo”, avalia. O empresário faz referência às modificações na tributação feitas no texto original da reforma por causa das concessões a setores.
Mas a insatisfação de Zimerman, que é integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, para o tema cross border (comércio eletrônico por meio de marketplaces internacionais), vai além da reforma tributária. Ele cobra celeridade do governo para voltar a tributar as compras de até US$ 50 feitas pelos brasileiros em marketplaces asiáticos isentadas em agosto pelo governo, depois de um embate político.
De acordo com o empresário, ficou acertado entre o varejo e o governo que a tributação voltaria em outubro ou novembro. A expectativa, diz ele, era que a volta do imposto fosse mais rápida. O varejo, segundo Zimerman, quer isonomia na tributação e está desconfortável com a pauta política desse assunto. “Sabemos que, se o ministro (Fernando Haddad, da Fazenda) não tiver retaguarda para fazer o que precisa ser feito, há chance de dar confusão novamente, como deu no início deste ano.” A seguir os principais trechos da entrevista.
O que a reforma tributária está fazendo de mais perigoso é remover todos esses anos de conhecimento de cada setor, procurando ser algo quase igual para todo mundo. E já não é igual porque cada setor reclamou e começaram aparecer duas, três alíquotas. Começou a aparecer o manicômio (tributário) de novo. E tem a grande possibilidade de o manicômio ficar pior. Muito se fala dos setores que serão desonerados e pouco se fala sobre quem vai pagar a conta.
Na teoria, quem vai pagar a conta são os prestadores de serviços, o comércio, de maneira geral. Mas isso é uma grande planilha de Excel, feita com base em exercícios teóricos. Vejo quanto cada setor tem de volume de negócios, aplico alíquota e quanto vai pagar. O que é desconsiderado nessa conta é que há setores com alta capacidade de repasse, por exemplo, telecomunicações, energia elétrica, combustíveis. Todas as empresas desses setores são formais, não tem empresas pequenas que sonegam e todo mundo cumpre a lei. Quando você vai diminuindo os impostos desses setores e transferindo para setores altamente competitivos, muito pulverizados, parte-se da premissa absolutamente teórica que eles vão pagar imposto. A minha questão é: será que vão? Eu sinceramente não acredito, porque quanto maior é o imposto nesses setores muito competitivos, mais aumenta a sonegação.
Acho que vai piorar. A única trava que precisamos para termos o mínimo de segurança na reforma seria colocar uma alíquota máxima que pode ser cobrada.
Porque equilíbrio fiscal não pode ser um sistema que simplesmente quando falta dinheiro você aumenta a alíquota de quem recolhe impostos. Quando a arrecadação não é suficiente, existem dois caminhos: combater a sonegação e olhar a despesa. Quando se faz uma reforma tributária que antecede a reforma administrativa, corre-se o risco de fazer uma reforma absolutamente equivocada. O certo seria definir o tamanho do Estado para ter uma reforma tributária que faça sentido. O governo fala em reforma tributária neutra. Mas eu pergunto: neutra com o quê? Em relação ao atual sistema (tributário) ou com o nível de despesas? Hoje existe um déficit fiscal que não é coberto pela receita atual. O novo sistema tributário vai cobrir o déficit ou a gente vai reduzir despesas? Recentemente, o que chamou atenção foi o governo comemorar que vai arrecadar R$ 25 bilhões com a taxação das offshores e dos fundos exclusivos. Diga-se de passagem, eu concordo com essa tributação. E a renúncia (fiscal) para o cross border (comércio eletrônico por meio de marketplaces internacionais)?
Só no ano de 2022 o governo renunciou a R$ 36 bilhões de Imposto de Importação no cross border, prejudicando o emprego, o varejo e a indústria nacional. Na verdade, o que aconteceu no ano passado foi uma fraude, porque não tinha isenção. O governo não arrecadou porque as importações foram fraudulentas.
O que o Remessa Conforme (programa da Receita Federal para determinar uma nova forma de tributação de importação para marketplaces) fez foi acabar com o crime e legalizar (a isenção sobre Imposto de Importação). O Imposto de Importação passou a ser zero para compras até US$ 50, mas paga-se um ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de 17%. O Imposto de Importação zero é uma renúncia fiscal do governo em favor das plataformas asiáticas.
Obviamente, a intenção do ministro Haddad (Fernado Haddad, da Fazenda), uma vez as plataformas aderindo ao Remessa, é que elas passem a ser tributadas mais para a frente. Mas quando, com qual porcentual? Isso não está claro, porque existe a pressão equivocada de muita gente que pretensamente fala em defender o pobre (que compra nesses marketplaces). Na verdade, não está defendendo o pobre, mas fazendo uma agressão contra o varejo nacional, a indústria, contra o emprego. O Brasil está virando exportador de consumidores. Pega a renda gerada no País e manda para fora.
O Remessa Conforme é um evento muito recente. Acho que tem um lado bom, porque a Receita está tendo mais acesso para entender o que a gente falava há tempos sobre fraudes cometidas. O Remessa permite ao governo fiscalizar os CPFs (Cadastro de Pessoa Física) que estão comprando. Há CPFs que estão comprando muita coisa para revender. Apoiamos a ideia do Remessa. O ministro Haddad e a sua equipe têm se esforçado em fazer a coisa certa. Mas existe uma questão política, que não é uma questão técnica da Receita ou do Ministério, no sentido de sucumbir à pressão das redes sociais, muitas vezes estimulada pela próprias plataformas por meio de influenciadores.
O Remessa tem o mérito de colocar o holofote para que a Receita saiba o que está acontecendo. Com esse mecanismo, houve uma redução de 60% para zero do Imposto de Importação para (compras) até US$ 50. Isso gerou uma enorme falta de isonomia entre varejistas nacionais, indústrias versus as que estão fora do País por algum tempo. Só que, para nós, já era tempo de isso ter sido corrigido.
Ficou acertado que a situação estaria equacionada entre outubro e novembro. Só que houve atraso na adesão das plataformas ao Remessa Conforme. A expectativa era que fosse mais rápido. O varejo está bastante desconfortável com a pauta política desse assunto. Sabemos que, se o ministro não tiver retaguarda para fazer o que precisa ser feito, há chance de dar confusão novamente, como deu no início deste ano.
Quando conversamos com o ministro e com a Receita defendemos o conceito de isonomia tributária. O ministro Haddad reconheceu a justiça que estamos pleiteando. Não estamos pleiteando benefícios, só isonomia. O que foi feito foi tirar qualquer tipo de isonomia. A alíquota de 60% que havia anteriormente do Imposto de Importação não era uma proteção. Quando se aplica 60%, mais 17% de ICMS, a tributação beira 80%, 90%. São mais ou menos os impostos que o varejo nacional paga. Só que agora (com a isenção de 60%) é um escândalo. Imagina o varejista brasileiro pagando 100% de impostos, em média, contra 17% do cross border?
Estamos defendendo, pelo Conselhão e pelo IDV (Instituto para o Desenvolvimento do Varejo), a isonomia.
Para ficar tecnicamente no zero a zero, o Imposto de Importação seria entre 73% e 74%, segundo estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário.
Já está colocado.
Que não consegue fazer isso de uma vez e que precisaria trabalhar em etapas.
Com os juros altos do jeito que estão, é difícil. A nossa expectativa é que até o final do ano esse assunto seja resolvido.
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