“Ser intelectualmente curioso é estar vivo”, Umberto Eco disse certa vez. O pensador italiano, que morreu em 2016, era professor, romancista – escreveu, de forma notável e ao mesmo tempo inescapável, O Nome da Rosa – semioticista, colunista e conhecedor dos arcanos. Ele também transmitia um certo humor ao ler e pensar sobre o mundo e a literatura, uma noção de que a erudição poderia ser não apenas edificante, mas também divertida.
Umberto Eco: A Library of the World, inédito no Brasil, celebra o homem e suas muitas estantes, mas é seu apelo simbólico que se destaca acima de tudo.
O documentário de Davide Ferrario mostra a fisicalidade dos livros, com bibliotecas de Torino, Itália, a Tianjin, China, antes de entrar nos interesses ecléticos de Eco, com gracejos e insights sobre a memória e o ruído da modernidade.
A paixão de Eco pelo cânone literário é clara, mas ouvimos mais sobre suas andanças por algumas de suas esquisitices favoritas, como Athanasius Kircher, um estudioso jesuíta do século 17 que escreveu tratados extensos e às vezes equivocados.
Leituras dramáticas bem-intencionadas dos escritos de Eco são pontuadas com anedotas afetuosas de seus filhos e de um neto que lustram a imagem de Eco como o estudioso extravagante.
Seu amor pelos arcanos fornece uma excentricidade que parece interessar ao filme mais do que seu trabalho semiótico ou comentário político (ele foi crítico de Silvio Berlusconi desde os anos 1990).
O romance de estreia de Eco em 1980, O Nome da Rosa, um mistério de assassinato ambientado em um mosteiro do século 14, tornou-se um sucesso surpreendente. Eco descreve nitidamente o apelo de tal investigação detetivesca como algo essencialmente espiritual, perguntando, quem está por trás de tudo isso?
Depois ele continuaria com aventuras mais esotéricas, como O Pêndulo de Foucault (1988). Ao longo de sua obra, o frisson da ficção e seus muito artifícios atraíram Eco, desde relatos de viagens especulativos até o fenômeno da mentira.
Os espectadores (e leitores) de certa idade podem se perguntar se o perfil de Eco não ficou um pouco apagado. O documentário de Ferrario apresenta uma figura que se sente mais europeia que internacional, para não dizer antiquada. (Definitivamente, era um cara que gostava de explicar seu desprezo pelo celular). Mas explorar mundos fictícios com Eco como guia continua sendo uma busca divertida e muitas vezes iluminadora.
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