Essência (filosofia), em filosofia,
termo que designa o caráter próprio ou a natureza mesma de um objeto, de um ser
ou de uma idéia, em oposição às suas propriedades contingentes. Assim, se se
admitir que a essência de Sócrates é pertencer à espécie humana, dizer que ele é
um ser humano é, pois, uma verdade necessária.
A tese, segundo a qual os objetos possuem essências, pode ser fundada
como é exposta a seguir. É justo supor que um objeto pode não ter algumas
propriedades que tem de fato. Sócrates, por exemplo, poderia não ter sido
executado pelos atenienses, em 399 a.C. e poderia, em vez disso, ter morrido
tranqüilamente enquanto dormia, alguns anos mais tarde. No entanto, as
propriedades que poderiam lhe faltar não podem ser multiplicadas
arbitrariamente. Suponhamos que alguém sugerisse que Sócrates poderia ter sido
uma girafa e não um ser humano. Ninguém contestaria que teríamos simplesmente
deixado de falar de uma possibilidade real referente ao Sócrates histórico. O
Sócrates histórico — este indivíduo, em particular — não poderia ter sido outra
coisa que não fosse um ser humano. Isto porque o fato de ter sido um ser humano
pertence à essência de Sócrates, contrariamente ao fato de ter sido executado,
em 399 a.C.
Alguns filósofos consideram que a essência de um objeto é o que
constitui sua identidade, isto é, o que faz o objeto ser o que ele é. Sua
essência pode se consistir em sua pertinência a uma espécie natural, como na
afirmação segundo a qual Sócrates é humano por essência. Outros pensadores
afirmam que cada objeto tem uma essência individual única. Um caso de essência
individual especial, mas, controvertida, chamada “singularidade”, é a
propriedade que tem um objeto de ser precisamente este objeto. Evidentemente, se
existem singularidades, é que existem propriedades que não poderiam fazer falta
a um objeto.
Para Aristóteles, a definição de uma coisa enuncia sua essência. Não se
alcança a compreensão científica de uma coisa a não ser que se perceba sua
essência. Aristóteles identifica a essência do objeto à sua forma substancial:
ela é o que faz o objeto ser o que ele é. Para Aristóteles, a essência de um
objeto é a espécie de coisa que ele é: assim, a essência de Sócrates é ser um
ser humano e a essência de uma casa é ser um abrigo para os homens e os
bens.
Este estreito elo, manifesto no pensamento de Aristóteles, entre a
essência, definição e os critérios que permitem identificar a pertinência de uma
coisa a uma espécie, foi questionado outra vez por John Locke. Este introduziu
uma distinção entre a “essência real” de um objeto, que ele definia como a
constituição interior de suas partes subjacentes, e sua “essência nominal”. A
essência nominal do objeto é a idéia correspondente ao nome do objeto em nosso
espírito. Esta idéia é uma lista, mais ou menos exaustiva, das qualidades
sensíveis, conhecidas, do objeto. Uma vez que a essência real de um objeto nos é
desconhecida, segundo Locke, os critérios que nos permitem identificar um objeto
são distintos de sua natureza subjacente.
O debate sobre a essência na filosofia contemporânea está centrado na
questão de conhecer o tipo de necessidade implicado na afirmação, segundo a qual
uma propriedade essencial é uma propriedade que um objeto deve ter. Wilard Quine
adotou uma posição contra as essências, sustentando que o que faz a necessidade
de uma coisa não é uma particularidade do objeto em questão mas, antes, uma
particularidade da maneira como se o descreve. Por exemplo, pode-se fazer
referência ao número “nove” pelo algarismo “9” ou, havendo nove planetas no
Sistema solar, pela expressão, “o número de planetas”. Não obstante, se a frase
“nove é necessariamente maior do que sete” é verdadeira, a frase “o número de
planetas é necessariamente maior do que sete” é falsa, posto que pode ter
existido um número de planetas inferior a sete. A necessidade, afirma Quine, é
função da maneira como se descreve o objeto em questão.
O filósofo americano Saul Kripke ressaltou, ao contrário de Quine, que
o exemplo está ligado a uma particularidade da descrição (“o número de
planetas”). Kripke denomina este tipo de descrição “designador fraco”: ele não
designa o mesmo objeto em todos os mundos possíveis, isto é, em todas as
condições possíveis do mundo real. No oposto, os termos que designam uma espécie
natural e os nomes próprios são “designadores rígidos”. Por exemplo, o termo
“água” designa uma substância que é H2O em todos os mundos possíveis. A água é,
pois, necessariamente H2O, isto independentemente da maneira como descrevemos a
água. Também, as espécies naturais, como a água, possuem essências que podem ser
descobertas empiricamente. Kripke posicionou-se igualmente a favor das essências
individuais que ele vincula à necessidade das origens de uma coisa, por exemplo,
de um indivíduo oriundo de um óvulo fecundado particular e de esperma feito por
uma série particular de átomos.
A moderna discussão filosófica da essência está embutida em uma rede de
problemas pertinentes colocados sobre a modalidade, as teorias da denominação e
da referência, as espécies naturais e as leis da natureza.
Microsoft ® Encarta ® Encyclopedia 2002.
© 1993-2001
Microsoft Corporation.
Todos os direitos reservados.
Comentários