Acordes milenares
- O matemático grego Pitágoras (572 a.C.- 493 a.C.) desenvolveu um conceito de cura pelos intervalos e ritmos de uma melodia e formulou uma relação matemática entre os números e as notas musicais. Para ele, a música mostraria aos homens a harmonia do universo.
- Para outro grego, o filósofo Platão (428 a.C.-348 a.C.), a música tinha a ver com política. "Não se pode mudar o que quer que seja nos modos da música sem abalar a estabilidade do Estado", dizia. Ele acreditava também que a música pode "formar o juízo" das crianças, ligando noções de moral ao seu prazer.
- Seu colega Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) tinha idéias parecidas. Para ele, as harmonias muito tensas, em tom agudo, levam ao despotismo. Já as hamonias mais relaxantes, de sons graves, conduzem à anarquia. O ideal seria que se ouvissem melodias em tom intermediário - estas, sim, levariam ao regime político perfeito. Aristóteles afirmou também que a música suscita nas mentes perturbadas uma espécie de crise que favoreceria o retorno ao seu estado normal. A essa operação espiritual ele deu o nome de kátharsis, ou catarse, um conceito fundamental na estrutura do teatro ocidental, da qual foi o primeiro teórico.
- Os gregos antigos também ouviam cítara durante as refeições, convencidos do seu poder digestivo.
- Segundo a Bíblia, Davi tocava lira para acalmar o rei hebreu Saul durante suas crises de melancolia. Isso o tornou o predileto do rei, a ponto de enfrentar o gigante Golias e tornar-se o sucessor de Saul. O sucessor de Davi, Salomão, também era amante da música. Durante seu reinado, o templo de Jerusalém teria tido 4 000 músicos e cantores.
- O filósofo chinês Confúcio (551 a.C.-478 a.C.) acreditava que a música tinha valor espiritual e que alguns instrumentos musicais guardavam a pureza dos objetos sagrados. Por isso, dizia que para um homem ser verdadeiramente instruído em todas as coisas "é preciso estudar com cuidado a música e seus princípios naturais".
- Na Idade Média, qualquer engano na música do culto religioso tornaria inválida a missa, que teria de ser repetida. Assim, a Igreja Católica investiu em rigorosas escolas de música.
- Santo Adelmo (640-709), bispo em Sherborne, Inglaterra, atraía fiéis para as missas tocando harpa, pois seu rebanho só ouvia os sermões com atenção se fossem prefaciados com música.
- O italiano Carlo Bronschi (1705-1782), mais conhecido como Farinelli, teve o saco escrotal cortado para que sua voz afinasse, numa prática que originou uma categoria de cantores, os castratti. Era capaz de sustentar uma nota por mais de 1 minuto.
É bom para o corpo...
Som anestésico
Dois hospitais parisienses, o Armand-Trousseau e o Necker, usam a música na preparação das cirurgias pediátricas. Melodias harmoniosas e reconfortantes acompanham as crianças pelos elevadores e corredores até a sala de operação. Médicos dos dois hospitais concluíram que a música aumenta o grau de sucesso das anestesias e ajuda a criança a se recuperar do trauma da operação.
De boca aberta
Num estudo feito em 1993 em consultórios dentários que utilizam a música como meio auxiliar no tratamento odontológico de crianças, a pesquisadora Erly Silva, da Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas (MG), verificou um efeito bom ou excelente em 63,3% dos casos. No ano anterior, a dentista Gisele Bustillo avaliou o uso de musicoterapia em consultórios odontopediátricos e verificou que 92% das crianças ficaram relaxadas durante o tratamento. Pesquisa semelhante foi realizada com 600 voluntários nos Estados Unidos. Resultado: 60% disseram não ter sentido dor durante o tratamento odontológico feito com fundo musical.
Para enturmar
A música também é uma alternativa no tratamento de psicóticos, doentes mentais que geralmente têm dificuldade para manter a comunicação verbal. Em 1987, após gravar as imagens e o som produzidos por 39 pacientes do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a musicoterapeuta Maria Clarice Costa notou que a realização de uma tarefa em grupo, como tocar instrumentos, faz com que o psicótico sinta necessidade
Epilepsia sob controle
No ano passado a equipe do neurofisiologista John Hughes, diretor da Universidade de Illinois (EUA), tocou para pacientes epiléticos a Sonata para dois pianos em ré maior, de Mozart. As descargas elétricas em seu cérebro, muito maiores do que em quem não têm o problema, diminuíram drasticamente durante e depois da audição. O gráfico abaixo mostra as descargas em um desses pacientes, de 47 anos, antes, durante e depois da audição. A Universidade Federal de São Paulo está fazendo o mesmo tipo de pesquisa, com resultados semelhantes.
...E bom para a mente
Acalmando as feras
Crianças hiperativas são anormais? A psicóloga paulista Vera Helena Pessôa de Souza acha que não. Para sustentar seu ponto de vista, ela realizou na Universidade de São Paulo, em 1995, uma pesquisa com crianças de 9 e 10 anos consideradas hiperativas por professores e médicos. Elas foram filmadas ao lado de crianças "normais" ao copiar desenhos de uma lousa antes e depois de ouvir a música Trilogy, do roqueiro sueco Yngwie Malmsteen. No final, as hiperativas concentraram-se muito mais na atividade, enquanto a concentração das demais diminuiu. "A música fez com que, de alguma forma, as hiperativas direcionassem sua atenção para a atividade, ao contrário da habitual dispersão", explicou Vera. "Isso demonstra que elas são capazes, sim, de se concentrar." Ela recomenda aos pais que não censurem os filhos que estudam com o som ligado. "Se verificarem a produção dessas crianças enquanto ouvem música, podem ter uma bela surpresa. "
Efeito Mozart
Os neurologistas americanos Gordon Shaw, da Universidade da Califórnia, e Frances Rauscher, da Universidade do Wisconsin, descobriram o que, nos meios médicos, é chamado de Efeito Mozart. Eles foram os primeiros a utilizar, em 1993, uma música do compositor Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) em testes de inteligência em crianças. Tocaram a Sonata para dois pianos em ré maior antes e depois de aplicar testes de raciocínio relacionados com a resolução de questões matemáticas. O resultado da segunda bateria de testes foi muito melhor. A partir daí, vários cientistas passaram a utilizar essa música em experiências (veja o texto ao lado) também no Brasil. O compositor de música erudita Edmundo Villani-Côrtes, de São Paulo, não entende por que justamente essa música teria um efeito especial. "Ela não difere do estilo habitual de Mozart, com uma frase musical que se repete em seqüências ascendentes." Ele arrisca uma explicação. "Talvez deixe as pessoas num bom estado porque o ritmo, em ré maior, traz uma mensagem alegre e extrovertida e, por isso, atraente", diz.
Tão agudo que dá medo
As trilhas sonoras dos filmes são escolhidas a partir de um cuidadoso planejamento do efeito que podem causar na platéia. Sabe-se que sons agudos atingem a parte lobo-temporal do cérebro, responsável pela excitabilidade e pelos sinais de alerta. Lá, eles se relacionam com o sistema nervoso central, criando expectativas. Por isso algumas cenas se tornaram famosas pelo medo que causam, como a do chuveiro no filme Psicose, de Alfred Hitchcock (1899-1980), acompanhada de estridentes violinos. Já os sons graves atingem a região médio-basal do cérebro, relacionada a respostas neurovegetativas como os batimentos cardíacos. Por isso, os graves são sempre utilizados quando se quer obter concentração ou relaxamento. É o que acontece nos mantras do zen-budismo
A viagem do som, da orelha aos pés
Portal de entrada
O som bate no pavilhão da orelha e segue por um duto até o tímpano , que é uma membrana esticada com cerca de 1 centímetro de diâmetro. O tímpano vibra e provoca o movimento de três dos menores ossos do corpo: martelo , bigorna e estribo . Movendo-se em conjunto, esse trio envia vibrações por meio de um fluido à cóclea , tubo enrolado e cheio de pêlos, que ficam eriçados. A essa altura, o som se transforma em impulsos que chegam ao nervo auditivo e serão conduzidos ao cérebro, que os decodificará.
Mesa de som
As mensagens nervosas entram no cérebro pelo córtex auditivo e dali são distribuídas para outras regiões cerebrais. Mas há divergência entre os especialistas sobre o caminho feito a partir daí. O certo é que os impulsos provocam um enorme número de conexões e reações químicas no cérebro, dependendo do tipo de música - se já é conhecida, se é alegre ou triste e assim por diante. O cérebro reage a esses estímulos acionando neurônios que, por meio do cerebelo e da ponte , chegam à medula espinhal e, daí, vão se comunicar com resto do corpo.
Balanço irresistível
Quando os estímulos causados pela música atingem a medula espinhal, ela ativa uma rede de terminações nervosas espalhada pelo corpo. Por meio desses nervos, a mensagem musical é levada até os músculos . As fibras musculares, recebendo essas mensagens, movem-se de acordo com o tipo de música - acelerada ou lenta. Nesse momento, os estímulos se incorporam aos movimentos internos do organismo. É aí que a música externa se junta à música "interna" dos nossos órgãos, ou seja, o nosso próprio ritmo.
- O matemático grego Pitágoras (572 a.C.- 493 a.C.) desenvolveu um conceito de cura pelos intervalos e ritmos de uma melodia e formulou uma relação matemática entre os números e as notas musicais. Para ele, a música mostraria aos homens a harmonia do universo.
- Para outro grego, o filósofo Platão (428 a.C.-348 a.C.), a música tinha a ver com política. "Não se pode mudar o que quer que seja nos modos da música sem abalar a estabilidade do Estado", dizia. Ele acreditava também que a música pode "formar o juízo" das crianças, ligando noções de moral ao seu prazer.
- Seu colega Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) tinha idéias parecidas. Para ele, as harmonias muito tensas, em tom agudo, levam ao despotismo. Já as hamonias mais relaxantes, de sons graves, conduzem à anarquia. O ideal seria que se ouvissem melodias em tom intermediário - estas, sim, levariam ao regime político perfeito. Aristóteles afirmou também que a música suscita nas mentes perturbadas uma espécie de crise que favoreceria o retorno ao seu estado normal. A essa operação espiritual ele deu o nome de kátharsis, ou catarse, um conceito fundamental na estrutura do teatro ocidental, da qual foi o primeiro teórico.
- Os gregos antigos também ouviam cítara durante as refeições, convencidos do seu poder digestivo.
- Segundo a Bíblia, Davi tocava lira para acalmar o rei hebreu Saul durante suas crises de melancolia. Isso o tornou o predileto do rei, a ponto de enfrentar o gigante Golias e tornar-se o sucessor de Saul. O sucessor de Davi, Salomão, também era amante da música. Durante seu reinado, o templo de Jerusalém teria tido 4 000 músicos e cantores.
- O filósofo chinês Confúcio (551 a.C.-478 a.C.) acreditava que a música tinha valor espiritual e que alguns instrumentos musicais guardavam a pureza dos objetos sagrados. Por isso, dizia que para um homem ser verdadeiramente instruído em todas as coisas "é preciso estudar com cuidado a música e seus princípios naturais".
- Na Idade Média, qualquer engano na música do culto religioso tornaria inválida a missa, que teria de ser repetida. Assim, a Igreja Católica investiu em rigorosas escolas de música.
- Santo Adelmo (640-709), bispo em Sherborne, Inglaterra, atraía fiéis para as missas tocando harpa, pois seu rebanho só ouvia os sermões com atenção se fossem prefaciados com música.
- O italiano Carlo Bronschi (1705-1782), mais conhecido como Farinelli, teve o saco escrotal cortado para que sua voz afinasse, numa prática que originou uma categoria de cantores, os castratti. Era capaz de sustentar uma nota por mais de 1 minuto.
É bom para o corpo...
Som anestésico
Dois hospitais parisienses, o Armand-Trousseau e o Necker, usam a música na preparação das cirurgias pediátricas. Melodias harmoniosas e reconfortantes acompanham as crianças pelos elevadores e corredores até a sala de operação. Médicos dos dois hospitais concluíram que a música aumenta o grau de sucesso das anestesias e ajuda a criança a se recuperar do trauma da operação.
De boca aberta
Num estudo feito em 1993 em consultórios dentários que utilizam a música como meio auxiliar no tratamento odontológico de crianças, a pesquisadora Erly Silva, da Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas (MG), verificou um efeito bom ou excelente em 63,3% dos casos. No ano anterior, a dentista Gisele Bustillo avaliou o uso de musicoterapia em consultórios odontopediátricos e verificou que 92% das crianças ficaram relaxadas durante o tratamento. Pesquisa semelhante foi realizada com 600 voluntários nos Estados Unidos. Resultado: 60% disseram não ter sentido dor durante o tratamento odontológico feito com fundo musical.
Para enturmar
A música também é uma alternativa no tratamento de psicóticos, doentes mentais que geralmente têm dificuldade para manter a comunicação verbal. Em 1987, após gravar as imagens e o som produzidos por 39 pacientes do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a musicoterapeuta Maria Clarice Costa notou que a realização de uma tarefa em grupo, como tocar instrumentos, faz com que o psicótico sinta necessidade
Epilepsia sob controle
No ano passado a equipe do neurofisiologista John Hughes, diretor da Universidade de Illinois (EUA), tocou para pacientes epiléticos a Sonata para dois pianos em ré maior, de Mozart. As descargas elétricas em seu cérebro, muito maiores do que em quem não têm o problema, diminuíram drasticamente durante e depois da audição. O gráfico abaixo mostra as descargas em um desses pacientes, de 47 anos, antes, durante e depois da audição. A Universidade Federal de São Paulo está fazendo o mesmo tipo de pesquisa, com resultados semelhantes.
...E bom para a mente
Acalmando as feras
Crianças hiperativas são anormais? A psicóloga paulista Vera Helena Pessôa de Souza acha que não. Para sustentar seu ponto de vista, ela realizou na Universidade de São Paulo, em 1995, uma pesquisa com crianças de 9 e 10 anos consideradas hiperativas por professores e médicos. Elas foram filmadas ao lado de crianças "normais" ao copiar desenhos de uma lousa antes e depois de ouvir a música Trilogy, do roqueiro sueco Yngwie Malmsteen. No final, as hiperativas concentraram-se muito mais na atividade, enquanto a concentração das demais diminuiu. "A música fez com que, de alguma forma, as hiperativas direcionassem sua atenção para a atividade, ao contrário da habitual dispersão", explicou Vera. "Isso demonstra que elas são capazes, sim, de se concentrar." Ela recomenda aos pais que não censurem os filhos que estudam com o som ligado. "Se verificarem a produção dessas crianças enquanto ouvem música, podem ter uma bela surpresa. "
Efeito Mozart
Os neurologistas americanos Gordon Shaw, da Universidade da Califórnia, e Frances Rauscher, da Universidade do Wisconsin, descobriram o que, nos meios médicos, é chamado de Efeito Mozart. Eles foram os primeiros a utilizar, em 1993, uma música do compositor Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) em testes de inteligência em crianças. Tocaram a Sonata para dois pianos em ré maior antes e depois de aplicar testes de raciocínio relacionados com a resolução de questões matemáticas. O resultado da segunda bateria de testes foi muito melhor. A partir daí, vários cientistas passaram a utilizar essa música em experiências (veja o texto ao lado) também no Brasil. O compositor de música erudita Edmundo Villani-Côrtes, de São Paulo, não entende por que justamente essa música teria um efeito especial. "Ela não difere do estilo habitual de Mozart, com uma frase musical que se repete em seqüências ascendentes." Ele arrisca uma explicação. "Talvez deixe as pessoas num bom estado porque o ritmo, em ré maior, traz uma mensagem alegre e extrovertida e, por isso, atraente", diz.
Tão agudo que dá medo
As trilhas sonoras dos filmes são escolhidas a partir de um cuidadoso planejamento do efeito que podem causar na platéia. Sabe-se que sons agudos atingem a parte lobo-temporal do cérebro, responsável pela excitabilidade e pelos sinais de alerta. Lá, eles se relacionam com o sistema nervoso central, criando expectativas. Por isso algumas cenas se tornaram famosas pelo medo que causam, como a do chuveiro no filme Psicose, de Alfred Hitchcock (1899-1980), acompanhada de estridentes violinos. Já os sons graves atingem a região médio-basal do cérebro, relacionada a respostas neurovegetativas como os batimentos cardíacos. Por isso, os graves são sempre utilizados quando se quer obter concentração ou relaxamento. É o que acontece nos mantras do zen-budismo
A viagem do som, da orelha aos pés
Portal de entrada
O som bate no pavilhão da orelha e segue por um duto até o tímpano , que é uma membrana esticada com cerca de 1 centímetro de diâmetro. O tímpano vibra e provoca o movimento de três dos menores ossos do corpo: martelo , bigorna e estribo . Movendo-se em conjunto, esse trio envia vibrações por meio de um fluido à cóclea , tubo enrolado e cheio de pêlos, que ficam eriçados. A essa altura, o som se transforma em impulsos que chegam ao nervo auditivo e serão conduzidos ao cérebro, que os decodificará.
Mesa de som
As mensagens nervosas entram no cérebro pelo córtex auditivo e dali são distribuídas para outras regiões cerebrais. Mas há divergência entre os especialistas sobre o caminho feito a partir daí. O certo é que os impulsos provocam um enorme número de conexões e reações químicas no cérebro, dependendo do tipo de música - se já é conhecida, se é alegre ou triste e assim por diante. O cérebro reage a esses estímulos acionando neurônios que, por meio do cerebelo e da ponte , chegam à medula espinhal e, daí, vão se comunicar com resto do corpo.
Balanço irresistível
Quando os estímulos causados pela música atingem a medula espinhal, ela ativa uma rede de terminações nervosas espalhada pelo corpo. Por meio desses nervos, a mensagem musical é levada até os músculos . As fibras musculares, recebendo essas mensagens, movem-se de acordo com o tipo de música - acelerada ou lenta. Nesse momento, os estímulos se incorporam aos movimentos internos do organismo. É aí que a música externa se junta à música "interna" dos nossos órgãos, ou seja, o nosso próprio ritmo.
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