O estudo da consciência humana ganhou uma nova disciplina e os distúrbios mentais, um novo método de tratamento com a criação da psicanálise, inaugurada em 1900 pela publicação de A Interpretação dos Sonhos, de Sigmund Freud. Polêmica até hoje, a visão freudiana chocou muita gente ao propor que nós, seres supostamente racionais, somos, na verdade, governados por impulsos inconscientes mas que podem ser decifrados pela interação entre o analista e seu paciente. Obtendo resultados inegáveis, Freud abriu campo para uma série de discípulos e dissidentes, cujas idéias, resumidas aqui, fizeram do século XX o cenário da maior revolução na história da psicologia.
Josef Breuer (1842-1925)
O médico austríaco ficou conhecido pelo caso de Anna O., paciente que ele curou da histeria ao fazê-la relembrar, por meio da hipnose, de traumas sofridos na infância. Breuer contou o caso a Freud e acabou escrevendo, em parceria com ele, os Estudos sobre a Histeria (1895). Freud mais tarde reconheceu Breuer como o principal precursor da psicanálise
Catarse
Breuer descobriu que nossa mente pode varrer para debaixo do tapete traumas antigos e desejos sexuais que ela própria considera repulsivos. Esse represamento seria a fonte das neuroses e a catarse, o momento revelador em que relembramos o trauma. Quando a causa do problema é descoberta, os sintomas desaparecem
Jean-Martin Charcot (1825-1893)
Um dos fundadores da neurologia moderna, Charcot usava a hipnose para tentar tratar e descobrir as causas da histeria, distúrbio que atormentava muitas mulheres na Europa da época (vide Mundo Estranho de setembro). Foi assistindo às aulas de Charcot, em Paris, que Freud começou a entender que os problemas psicológicos podiam estar na mente e não na fisiologia do cérebro
Otto Rank (1884-1939)
Inicialmente discípulo de Freud, foi o primeiro antes mesmo do próprio mestre a usar a psicanálise para explicar a arte, a religião e os mitos. Rank rompeu com os freudianos ortodoxos ao sustentar que a fonte de muitas neuroses poderia estar no trauma do parto
SIGMUND FREUD (1856-1939)
Começou sua carreira como psiquiatra em Viena, estudando os efeitos da cocaína. O contato com Charcot e Breuer trouxe a virada decisiva para sua carreira. Em sua clínica, porém, Freud descobriu que deixar o paciente falar livremente, associando idéias e relatando seus sonhos, era mais eficiente do que a hipnose. Essa descoberta inaugurou a psicanálise e seus resultados fizeram dele um dos pensadores mais influentes do século XX
Consciente e inconsciente
Freud afirmava que desejos e conflitos reprimidos ficam alojados na mente inconsciente, influindo decisivamente em nosso comportamento. É nos sonhos e em breves deslizes e reticências durante as sessões de análise que se revela o inconsciente - e, para desvendá-lo, o analista tem de agir como um detetive
Ato falho
Nos fascinantes casos relatados em Psicopatologia da Vida Cotidiana, publicado em 1901, Freud mostra como uma descuidada troca de palavras ou o esquecimento de um objeto como uma caneta são significativas manifestações do inconsciente: os chamados atos falhos. O fato de perdermos um presente que um amigo nos deu, por exemplo, pode ser uma forma de auto-sacrifício que nós nos impusemos para compensar o ódio inconsciente que devotamos a essa pessoa
Complexo de Édipo
Personagem da célebre tragédia grega, Édipo assassina o pai e casa-se com a própria mãe sem ter consciência do que está fazendo. Segundo Freud, todo ser humano deseja fazer o mesmo nos primeiros anos de vida. Atraída sexualmente pela mãe (ou pelo pai, se for menina), a criança sente raiva do pai e teme ser castrado por seu desejo proibido. Quando este conflito não é superado ainda na infância, pode causar graves neuroses no futuro
Id, Ego e Superego
Freud refinaria sua separação entre consciente e inconsciente dividindo a psique em id, ego e superego. O id seria o estrato inconsciente e irracional, cujos fins são garantir sua preservação e a satisfação dos desejos. O superego nasce do medo da castração e se torna o estrato moral, que reprime as vontades do id. Ele torna possível a vida civilizada, mas é constante fonte de neuroses e sentimentos de culpa. Já o ego seria o intermediário racional e consciente que tenta equilibrar as vontades opostas de ego e superego
Alfred Adler (1870-1937)
Esse psiquiatra austríaco começou a colaborar com Freud já em 1902, mas aos poucos foi rompendo com ele. Tornou-se um dos maiores críticos da insistência do pai da psicanálise em apontar a sexualidade e o Complexo de Édipo como os fatores determinantes do comportamento humano
Complexo de inferioridade
O conceito, hoje incorporado à linguagem cotidiana, foi criado por Adler. Ele dizia que todos almejamos a perfeição e o afeto alheio. Quando essa ambição é frustrada, buscamos inconscientemente compensar o sentimento de inferioridade com um comportamento agressivo ou uma exagerada auto-afirmação
Carl Jung (1875-1961)
O estudante suíço de psiquiatria chegou de forma independente a algumas das mesmas conclusões de Freud, tornando-se seu amigo e correspondente. Mais tarde, rompeu com ele por não concordar que as neuroses tivessem bases exclusivamente sexuais. Místico de grande erudição, Jung dedicou-se a estudar pelo ângulo psicológico disciplinas esotéricas como a alquimia e as filosofias espiritualistas orientais
Introversão e extroversão
Jung dividiu o ser humano em dois tipos: extrovertidos e introvertidos. Junto com essa teoria, definiu quatro funções mentais: intuição, pensamento, sentimento e sensação. Em cada indivíduo, predominaria uma ou mais dessas funções. Essas classificações são até hoje usadas em testes psicológicos para admissão em empresas
Inconsciente coletivo
Estudando mitos e religiões, Jung observou que seus temas centrais se repetiam nas mais variadas culturas. Isso o levou a postular que essas formulações estariam armazenadas em uma mente inconsciente coletiva, inerente a toda a espécie humana
Arquétipos
No inconsciente coletivo estaria gravado o que Jung chamou de arquétipos psicológicos: temas e personalidades ideais que todo ser humano teria em si e que as culturas transformam em mitos. Jung identificou centenas de arquétipos, como guerreiro, sábio, mártir, amante, mago, criador, bufão e destruidor
Sándor Ferenczi (1873-1933)
Em 1908, esse ex-cirurgião do exército austríaco conheceu Freud e ingressou nas fileiras psicanalíticas. Sua carreira concentrou-se em mudar as práticas de consultório. Depois de ver fracassar sua idéia de "terapia ativa" - que, entre outras coisas, pregava a abstinência sexual dos pacientes -, ele adotou a "terapia permissiva", que prega um relacionamento mais afetivo, menos técnico, entre analista e paciente
Anna Freud (1895-1982) e Melanie Klein (1882-1960)
Foram as herdeiras do estudo freudiano da criança. Filha caçula de Freud, Anna dedicou-se ao funcionamento do ego durante o crescimento. Klein, aluna de Ferenczi, investigou as brincadeiras infantis, que, segundo ela, também revelavam o inconsciente de maneira privilegiada. As duas eram rivais e suas facções disputaram o domínio da psicanálise inglesa durante décadas após a morte de Freud
William Reich (1897-1957)
Ao contrário de outros dissidentes, que criticavam a importância dada por Freud à sexualidade, Reich radicalizou-a ainda mais. Casando psicanálise e marxismo, pregava que a repressão sexual servia à ganância capitalista. Morreu numa prisão americana, acusado de charlatanismo ao tratar pacientes nas chamadas "caixas de orgônio", máquinas criadas para atrair "energia cósmica"
Libido
Freud chama de libido a energia sexual inata que controla o comportamento humano desde o nascimento e é a principal fonte dos instintos primitivos que compõem o id. Reich promove o conceito à categoria de fator mais importante no desenvolvimento da personalidade e insiste na liberação e satisfação sadias dessa energia
Jacques Lacan (1901-1981)
Médico psiquiatra francês, combinou a psicanálise com a ciência lingüística recém-nascida na Europa, reinterpretando as idéias de Freud. O Complexo de Édipo, para Lacan, nada mais é que o trauma sofrido pela criança ao aprender a linguagem e descobrir que é um indivíduo separado do mundo
Imaginário, símbolo e realidade
Para Lacan, há duas formas de perceber a realidade. Antes de aprender a falar e pensar com palavras, a criança vive a forma imaginária, baseada em experiências visuais, e não se distingue do ambiente que a cerca. Depois, ao assimilar a linguagem, junto com as regras sociais e morais, ela entra no Reino do Simbólico: descobre que é um indivíduo isolado e aprende a representar a realidade através de símbolos
O sujeito partido
Ao perceber o mundo através de símbolos, perdemos para sempre o contato direto (mesmo que imaginário) com a realidade nua e crua. Para Lacan, essa separação é a grande angústia da humanidade: somos todos sujeitos partidos, sofrendo pela falta de algo que não sabemos o que é
Josef Breuer (1842-1925)
O médico austríaco ficou conhecido pelo caso de Anna O., paciente que ele curou da histeria ao fazê-la relembrar, por meio da hipnose, de traumas sofridos na infância. Breuer contou o caso a Freud e acabou escrevendo, em parceria com ele, os Estudos sobre a Histeria (1895). Freud mais tarde reconheceu Breuer como o principal precursor da psicanálise
Catarse
Breuer descobriu que nossa mente pode varrer para debaixo do tapete traumas antigos e desejos sexuais que ela própria considera repulsivos. Esse represamento seria a fonte das neuroses e a catarse, o momento revelador em que relembramos o trauma. Quando a causa do problema é descoberta, os sintomas desaparecem
Jean-Martin Charcot (1825-1893)
Um dos fundadores da neurologia moderna, Charcot usava a hipnose para tentar tratar e descobrir as causas da histeria, distúrbio que atormentava muitas mulheres na Europa da época (vide Mundo Estranho de setembro). Foi assistindo às aulas de Charcot, em Paris, que Freud começou a entender que os problemas psicológicos podiam estar na mente e não na fisiologia do cérebro
Otto Rank (1884-1939)
Inicialmente discípulo de Freud, foi o primeiro antes mesmo do próprio mestre a usar a psicanálise para explicar a arte, a religião e os mitos. Rank rompeu com os freudianos ortodoxos ao sustentar que a fonte de muitas neuroses poderia estar no trauma do parto
SIGMUND FREUD (1856-1939)
Começou sua carreira como psiquiatra em Viena, estudando os efeitos da cocaína. O contato com Charcot e Breuer trouxe a virada decisiva para sua carreira. Em sua clínica, porém, Freud descobriu que deixar o paciente falar livremente, associando idéias e relatando seus sonhos, era mais eficiente do que a hipnose. Essa descoberta inaugurou a psicanálise e seus resultados fizeram dele um dos pensadores mais influentes do século XX
Consciente e inconsciente
Freud afirmava que desejos e conflitos reprimidos ficam alojados na mente inconsciente, influindo decisivamente em nosso comportamento. É nos sonhos e em breves deslizes e reticências durante as sessões de análise que se revela o inconsciente - e, para desvendá-lo, o analista tem de agir como um detetive
Ato falho
Nos fascinantes casos relatados em Psicopatologia da Vida Cotidiana, publicado em 1901, Freud mostra como uma descuidada troca de palavras ou o esquecimento de um objeto como uma caneta são significativas manifestações do inconsciente: os chamados atos falhos. O fato de perdermos um presente que um amigo nos deu, por exemplo, pode ser uma forma de auto-sacrifício que nós nos impusemos para compensar o ódio inconsciente que devotamos a essa pessoa
Complexo de Édipo
Personagem da célebre tragédia grega, Édipo assassina o pai e casa-se com a própria mãe sem ter consciência do que está fazendo. Segundo Freud, todo ser humano deseja fazer o mesmo nos primeiros anos de vida. Atraída sexualmente pela mãe (ou pelo pai, se for menina), a criança sente raiva do pai e teme ser castrado por seu desejo proibido. Quando este conflito não é superado ainda na infância, pode causar graves neuroses no futuro
Id, Ego e Superego
Freud refinaria sua separação entre consciente e inconsciente dividindo a psique em id, ego e superego. O id seria o estrato inconsciente e irracional, cujos fins são garantir sua preservação e a satisfação dos desejos. O superego nasce do medo da castração e se torna o estrato moral, que reprime as vontades do id. Ele torna possível a vida civilizada, mas é constante fonte de neuroses e sentimentos de culpa. Já o ego seria o intermediário racional e consciente que tenta equilibrar as vontades opostas de ego e superego
Alfred Adler (1870-1937)
Esse psiquiatra austríaco começou a colaborar com Freud já em 1902, mas aos poucos foi rompendo com ele. Tornou-se um dos maiores críticos da insistência do pai da psicanálise em apontar a sexualidade e o Complexo de Édipo como os fatores determinantes do comportamento humano
Complexo de inferioridade
O conceito, hoje incorporado à linguagem cotidiana, foi criado por Adler. Ele dizia que todos almejamos a perfeição e o afeto alheio. Quando essa ambição é frustrada, buscamos inconscientemente compensar o sentimento de inferioridade com um comportamento agressivo ou uma exagerada auto-afirmação
Carl Jung (1875-1961)
O estudante suíço de psiquiatria chegou de forma independente a algumas das mesmas conclusões de Freud, tornando-se seu amigo e correspondente. Mais tarde, rompeu com ele por não concordar que as neuroses tivessem bases exclusivamente sexuais. Místico de grande erudição, Jung dedicou-se a estudar pelo ângulo psicológico disciplinas esotéricas como a alquimia e as filosofias espiritualistas orientais
Introversão e extroversão
Jung dividiu o ser humano em dois tipos: extrovertidos e introvertidos. Junto com essa teoria, definiu quatro funções mentais: intuição, pensamento, sentimento e sensação. Em cada indivíduo, predominaria uma ou mais dessas funções. Essas classificações são até hoje usadas em testes psicológicos para admissão em empresas
Inconsciente coletivo
Estudando mitos e religiões, Jung observou que seus temas centrais se repetiam nas mais variadas culturas. Isso o levou a postular que essas formulações estariam armazenadas em uma mente inconsciente coletiva, inerente a toda a espécie humana
Arquétipos
No inconsciente coletivo estaria gravado o que Jung chamou de arquétipos psicológicos: temas e personalidades ideais que todo ser humano teria em si e que as culturas transformam em mitos. Jung identificou centenas de arquétipos, como guerreiro, sábio, mártir, amante, mago, criador, bufão e destruidor
Sándor Ferenczi (1873-1933)
Em 1908, esse ex-cirurgião do exército austríaco conheceu Freud e ingressou nas fileiras psicanalíticas. Sua carreira concentrou-se em mudar as práticas de consultório. Depois de ver fracassar sua idéia de "terapia ativa" - que, entre outras coisas, pregava a abstinência sexual dos pacientes -, ele adotou a "terapia permissiva", que prega um relacionamento mais afetivo, menos técnico, entre analista e paciente
Anna Freud (1895-1982) e Melanie Klein (1882-1960)
Foram as herdeiras do estudo freudiano da criança. Filha caçula de Freud, Anna dedicou-se ao funcionamento do ego durante o crescimento. Klein, aluna de Ferenczi, investigou as brincadeiras infantis, que, segundo ela, também revelavam o inconsciente de maneira privilegiada. As duas eram rivais e suas facções disputaram o domínio da psicanálise inglesa durante décadas após a morte de Freud
William Reich (1897-1957)
Ao contrário de outros dissidentes, que criticavam a importância dada por Freud à sexualidade, Reich radicalizou-a ainda mais. Casando psicanálise e marxismo, pregava que a repressão sexual servia à ganância capitalista. Morreu numa prisão americana, acusado de charlatanismo ao tratar pacientes nas chamadas "caixas de orgônio", máquinas criadas para atrair "energia cósmica"
Libido
Freud chama de libido a energia sexual inata que controla o comportamento humano desde o nascimento e é a principal fonte dos instintos primitivos que compõem o id. Reich promove o conceito à categoria de fator mais importante no desenvolvimento da personalidade e insiste na liberação e satisfação sadias dessa energia
Jacques Lacan (1901-1981)
Médico psiquiatra francês, combinou a psicanálise com a ciência lingüística recém-nascida na Europa, reinterpretando as idéias de Freud. O Complexo de Édipo, para Lacan, nada mais é que o trauma sofrido pela criança ao aprender a linguagem e descobrir que é um indivíduo separado do mundo
Imaginário, símbolo e realidade
Para Lacan, há duas formas de perceber a realidade. Antes de aprender a falar e pensar com palavras, a criança vive a forma imaginária, baseada em experiências visuais, e não se distingue do ambiente que a cerca. Depois, ao assimilar a linguagem, junto com as regras sociais e morais, ela entra no Reino do Simbólico: descobre que é um indivíduo isolado e aprende a representar a realidade através de símbolos
O sujeito partido
Ao perceber o mundo através de símbolos, perdemos para sempre o contato direto (mesmo que imaginário) com a realidade nua e crua. Para Lacan, essa separação é a grande angústia da humanidade: somos todos sujeitos partidos, sofrendo pela falta de algo que não sabemos o que é
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