Minha avó paterna era uma contadora de histórias – sempre tinha um causo para compartilhar, um poema para declamar, uma trova para nos entreter. Não tive muito contato com ela, mas lembro-me vividamente da fábula que ela nos contava sobre a briga entre o vento e o sol. Não sei se a compreendia totalmente na época, mas a mensagem ficou gravada.
A historieta é atribuída a Esopo, e diz que o Vento Norte e o Sol começaram a discutir para saber quem era mais poderoso. Como não chegavam a um acordo, combinaram um desafio: quem conseguisse arrancar o casaco de um viajante que vinha passando pela estrada seria o mais forte. O Vento foi na frente e começou a soprar, mas quanto mais ventava, mais o homem sentia frio e se agarrava às roupas para se aquecer. Vencido, o Vento desistiu e passou a vez para o Sol. Este começou a brilhar, fazendo com que o homem não aguentasse mais e arrancasse por vontade própria o casaco, atestando que o Sol era o mais forte.
Deixo para os leitores decidirem a moral da história – sempre há várias numa boa fábula – mas é difícil discordar de que o Sol é mesmo o mais poderoso.
Se o testemunho de Esopo não bastasse, as evidências científicas estão aí para mostrar como as ondas de calor alteram o comportamento humano.
Não que os ventos sejam inócuos: há muitos relatos de sua influência sobre nossos estados mentais, mas fato é que quase sempre isso acontece quando são ventos quentes. O vento de Santa Ana, na costa leste dos EUA; os ventos Foehn nos Alpes Suíços; o vento Zonda, na Argentina. E realmente o aumento brusco de temperatura pode ser bastante prejudicial à saúde mental.
Talvez você esteja experimentando um pouco disso nos últimos dias, com a nova onda de calor que atravessamos no Brasil. Irritabilidade, desconforto, dificuldade para dormir, inquietação. O mal estar que acompanha esse tempo quente pode, em alguns casos, levar a consequências bastante negativas: aumento de violência e casos de agressão; piora de quadros depressivos, maiores taxas de internações psiquiátricas, crescimento na incidência de tentativas e suicídios consumados. São casos extremos e felizmente muito mais raros do que um mau humor, mas seu aumento durante as ondas de calor tornam-se mais preocupantes quanto mais frequentes forem esses eventos climáticos.
A essa altura já aprendemos que mente e corpo funcionam como um todo integrado, e que não é possível cuidar da saúde de um negligenciando a de outro. Chegará o momento em que perceberemos que o mesmo vale para todos os seres vivos e seu ambiente?
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