Economistas do mercado presentes na segunda reunião do dia com diretores do Banco Central alertaram a autoridade monetária sobre o temor de que o governo responda ao esperado esfriamento da economia com um aumento das despesas públicas.
As informações sobre o encontro, que é fechado à imprensa, foram obtidas com participantes da reunião, que conversaram com o Estadão/Broadcast sob a condição de anonimato.
A reunião terminou às 12h30, antes de o relator do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), Danilo Forte, confirmar que o governo optou por não alterar a meta de déficit primário zero via emenda ao texto.
“Há uma preocupação de que esse governo, na hora em que olhar a atividade enfraquecendo, até nos números do terceiro trimestre, vai ver uma pressão por gasto e vai para o gasto”, relatou um participante do encontro. “Está todo mundo preocupado com o fiscal.”
Esse ponto de atenção surgiu como uma camada extra de preocupação com as contas públicas, já que os economistas também sinalizaram que a probabilidade de cumprimento da atual meta fiscal de 2024, que prevê déficit zero, é muito pouco provável.
Os economistas mostraram-se mais preocupados com o cenário externo. A percepção geral é de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) pode acabar mantendo os juros altos por mais tempo, com impacto sobre a política monetária doméstica.
“O pessoal estava falando em cortes dos juros americanos em abril, mas já apareceram pessoas falando que só no terceiro trimestre ou que, de repente, pode nem cortar em 2024, e que isso pesa contra uma queda maior da Selic aqui”, disse um economista.
A maioria das projeções para a taxa Selic no fim do ciclo ficou em 9,5%, segundo os participantes do encontro.
Na reunião, os analistas também disseram ao BC que a inflação de curto prazo continua favorável, embora haja preocupação com o comportamento do IPCA no próximo ano, devido aos impactos do fenômeno El Niño.
Pelo BC, participaram da reunião os diretores Diogo Guillen (Política Econômica), Fernanda Guardado (Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos) e Renato Dias Gomes (Organização do Sistema Financeiro e Resolução). O encontro foi realizado para ajudar na confecção do próximo Relatório Trimestral de Inflação, que será publicado em 21 de dezembro.
A decisão de não alterar a meta fiscal de 2024 agora é positiva e representa uma vitória do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Mas isso não elimina a avaliação de que uma mudança da meta já no começo do próximo ano é inevitável, segundo o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale.
“Haddad conseguiu transformar o que era uma clara derrota em uma vitória parcial, mas o risco é isso ser uma vitória de Pirro: postergar a mudança, mas, no começo do ano que vem, mudar a meta para um déficit maior”, alerta o economista.
Depois de uma reunião com Haddad nesta quinta-feira, 16, o relator do PLDO, deputado Danilo Forte, confirmou a jornalistas que o governo havia decidido não mudar a meta via emenda ao projeto.
Na sequência, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que também participou da reunião, reforçou o recado de compromisso com o déficit zero, defendido por Haddad. “Não há iniciativa do governo para mudar a meta fiscal”, disse.
Para Vale, o problema é que a equipe econômica dificilmente conseguirá os R$ 170 bilhões necessários para zerar o déficit primário do ano que vem sem uma reforma do Imposto de Renda, que não deverá ser discutida no próximo ano, enquanto o Congresso se ocupa das leis complementares da reforma tributária.
Ao mesmo tempo, o economista lembra que Haddad enfrentará grandes pressões para aumentar os gastos em um ano eleitoral. Isso deverá levar a uma mudança da meta, já que o governo não deverá se dispor a sofrer os gatilhos previstos pelo novo arcabouço.
“A mudança da meta está dada, o governo precisa aumentar o investimento para ter algo a mostrar para a população, especialmente porque o PT perdeu muitas prefeituras nos últimos anos”, diz Vale. “Com o crescimento desacelerando e menos arrecadação, um déficit na casa de até 1% do PIB pode acontecer.”
Por isso, o economista alerta para o risco de mudança do alvo para um déficit entre 0,75% e 1% do PIB — como preveem emendas à LDO apresentadas na terça-feira pelo deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) —, em vez do nível de -0,5% do PIB defendido por uma ala do governo. “Pode haver uma percepção que, mesmo mudando a meta para um déficit de 0,5%, ela não vai ser atingida”, afirma.
A informação de que o governo não vai mudar a meta fiscal agora, via emenda ao PLDO, também foi vista como uma notícia positiva por Luiz Fernando Figueiredo, chairman da Jive Investments e ex-diretor do Banco Central. Mas, segundo ele, não elimina a preocupação com as contas públicas.
“Foi bom manter a meta, mas tudo que diz ‘vamos manter a meta por enquanto’ é ruim, porque mostra que o governo não está tão firme com relação à política fiscal e ao Orçamento quanto deveria”, afirma. “No final das contas, o que interessa é saber qual é o grau de preocupação do governo com relação às metas.”
O deputado Danilo Forte disse após reunião com os ministros Fernando Haddad, Alexandre Padilha e Esther Dweck (Gestão) que o governo decidiu não mudar a meta fiscal de 2024 agora, mas não eliminou a possibilidade de uma alteração no futuro.
“O governo manteve a posição dele de meta fiscal zero. Tirou qualquer possibilidade de emenda ao relatório, qualquer mensagem modificativa com relação ao que está sendo decidido, e a preservação do arcabouço fiscal”, disse Forte. “A possibilidade de revisão poderá vir em alguma mudança no futuro, mas no presente o governo manteve a meta fiscal zero.”
Para Figueiredo, essa informação mantém a incerteza sobre o futuro dos alvos estabelecidos pelo novo arcabouço fiscal e com o compromisso do Executivo com as contas públicas. “A grande preocupação das pessoas é quanto o governo está comprometido em nos levar gradualmente para a sustentabilidade fiscal, da qual ainda estamos muito distantes”, afirma o ex-BC.
Em relatório, o Citi avaliou que a manutenção da meta de zerar o déficit primário em 2024, junto da busca por conseguir receitas extras, é uma sinalização importante de que o governo segue alocando capital político a fim de melhorar os resultados fiscais.
O banco argumenta que a manutenção, ao menos por ora, significa uma vitória inquestionável, ainda que temporária, de Haddad. “Nós alertamos, porém, que existem outras formas de alterar a meta daqui para frente, portanto o assunto não está totalmente resolvido.”
O Citi pondera que não espera que o governo consiga atingir o alvo de resultado primário zero no próximo ano. Apesar disso, a manutenção da meta é positiva do ponto de vista do preço de ativos, acrescenta.
Comentários