A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) está lançando uma linha de estudo inédita sobre felicidade e ambiente de trabalho. A iniciativa partiu da pesquisadora Chrystina Barros, certificada em felicidade pela Universidade de Berkeley, nos EUA. Berkeley e Harvard, outra instituição americana de ponta, já pesquisam há alguns anos a relação entre felicidade e trabalho, mas no Brasil esse campo ainda não foi tão explorado no universo acadêmico.
Os cientistas já têm alguns consensos sobre o que faz uma pessoa feliz. No fim do ano passado, especialistas de Harvard apresentaram um estudo sobre os sete caminhos da felicidade. Incluem: exercício físico, espiritualidade, contato com o novo, dedicação ao outro, negatividade longe e álcool sem exagero. Mas, propõe Chrystina, é preciso agregar a essa equação o aspecto econômico, que é a base de todo o resto.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a felicidade é a medida do progresso de um povo e, por isso, a busca pela felicidade deve nortear as políticas públicas. “Pessoas felizes movem o mundo”, diz Chrystina. “E geram lucro e prosperidade”, acrescenta.
A base da felicidade, por sua vez, está em ter algumas condições básicas atendidas, como alimentação, moradia, educação, mobilidade, segurança e lazer. O dinheiro, isoladamente, não traz felicidade, segundo a especialista, mas propicia as condições básicas para sermos felizes. “Sem dinheiro não da para ser feliz”, afirma ela.
Felicidade é um fenômeno individual, da pessoa, um saldo de que, na sua avaliação, a vida vale a pena. Vai ter tristeza, desespero, todas essas emoções, mas a questão é o saldo. O ranking da felicidade da OMS considera ainda outros fatores para a felicidade, como seguridade social, saúde, percepção de corrupção e liberdade para fazer escolhas. O que mostra que a economia precisa fazer parte dessa equação. Muita gente fica buscando na filosofia argumentos que romantizam a pobreza. É hipocrisia deixar a economia de fora.
Do ponto de vista da neurociência, a felicidade é um evento químico, uma série de substâncias que promovem uma sensação de bem estar. A felicidade é uma tempestade elétrica, mediada por substâncias químicas, que a gente inclusive pode reproduzir, fazendo exercícios físicos, por exemplo. Segundo a convenção de Alma-Ata (para a promoção da saúde) da OMS, lançada no Cazaquistão, em 1978, algumas necessidades básicas precisam ser atendidas, como emprego, educação, alimentação. E a saúde é o ponto básico para a felicidade.
A felicidade é tudo o que a humanidade almeja. Mas não é só por isso. Para termos o perfeito funcionamento das instituições, as pessoas precisam estar felizes. Pessoas felizes movem o mundo, não o contrário. Segundo a ONU, a felicidade é a medida do progresso de um povo.
A busca pela felicidade deve nortear as políticas públicas. Já está comprovado que pessoas que trabalham em ambientes melhores são mais felizes, geram experiências melhores para os clientes. Os clientes, por sua vez, se tornam mais fieis à marca, gerando lucratividade para a empresa. Há vários estudos sobre isso nas mais diferentes indústrias, mas muito poucos na área de saúde. Uma das primeiras propostas dessa nova linha de pesquisa é contribuir como instrumento de identificação das condições de quem trabalha na área da saúde, de quem lida com a saúde dos outros. Não podemos ter um ambiente de trabalho com pessoas doentes, infelizes, tristes.
Várias ciências estudam a felicidade: filosofia, psicologia, sociologia, além da economia e da política. E cada uma delas traz um aspecto fundamental. Daniel Kahneman, psicólogo e economista que ganhou o prêmio Nobel com sua proposição de colocar a economia comportamental no centro da discussão da lógica do consumo, estudou quanto de dinheiro alguém precisa para ser feliz. E não é pouco. Para a realidade de muitos países, é muito: são US$ 75 mil (cerca de R$ 387,5 mil) per capita nos Estados Unidos, para que a pessoa possa dar conta de seus gastos com o básico, que vem da Pirâmide de Maslow – alimentação, moradia, educação, mobilidade, segurança, lazer.
A mesma Universidade Harvard, que fez o fantástico estudo da longevidade e apresenta os sete passos para a vida feliz (exercício físico, espiritualidade, contato com o novo, dedicação ao novo, negatividade longe, álcool sem exagero), corrobora com outros tantos trabalhos, que dinheiro é parte fundamental da felicidade. Sinto falta de que, nas discussões sobre o tema, esta variável seja colocada de forma objetiva na mesa.
O dinheiro sozinho não traz felicidade. Mas é a base fundamental para garantir as pré-condições para uma vida feliz. Sem dinheiro, não dá para ser feliz. Mas ninguém quer dizer isso. É feio, né? Colocar o dinheiro na frente. Aí tem gente que fala: “mas o mais importante para mim é a minha família”. Certo, mas você vai viver com a sua família embaixo da ponte?
Nosso modelo de consumo, inclusive nas redes sociais, impõe que você vai ser feliz se tiver algo exclusivo, mais caro: o carro do ano, aquela roupa mais cara, uma viagem incrível. As pessoas são capazes de pagar uma fortuna por qualquer coisa que tenha um selo atribuído a status. Mas quando você compra uma coisa dessas, tem uma satisfação momentânea. É um modelo muito cruel que instiga experiências fugazes, que se esgotam rapidamente e geram a necessidade de novas experiências.
Outro problema é quando a economia se apropria de conceitos da filosofia ou da espiritualidade para fechar os olhos para a falta de condições de trabalho, alimentação, moradia. Quando a economia faz um mau uso do conceito de felicidade, transformando-o em um conceito romântico, para manter disparidades, desigualdades.
A felicidade instagramável não existe. Viver entre a euforia e a depressão é viver em estados patológicos. A obrigação de ser feliz em si já é um problema, um estado utópico que não existe. E as redes sociais impõem um padrão que vai gerar frustração por isso, porque é utópico. A tristeza faz parte da vida, lidar com dificuldades faz parte da vida. Teremos dias melhores e dias piores. A felicidade é um saldo positivo disso.
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