Pedro assina o cheque de Aloizio, que o põe nominal a Leonardo, que o deposita na conta de Pedro. Aloizio rubrica o cheque de Pedro, já nominal a Leonardo, que o deposita na conta de Aloizio, sem, no entanto, endossar no verso.
A única coisa que os bancos sempre conferem na compensação dos cheques é se os correntistas têm fundos para cobri-los. Se a assinatura que está no papel é a do cliente ou não, isso não importa. Também não faz diferença se o cheque está nominal ou não ao favorecido pelo depósito.
Para comprovar esse fato, a Folha pediu a quatro pessoas que fizessem um teste. O deputado Aloizio Mercadante (PT-SP), cliente do Itaú, e o senador Pedro Simon (PMDB-RS), correntista do BBV, aceitaram. Dois clientes do banco Real também toparam, mas pediram para não ser identificados.
A idéia inicial era cada um assinar o cheque do outro. Mercadante e Simon, no entanto, acharam melhor rubricar seus próprios cheques, mas com assinaturas totalmente diferentes das que constam de seus cadastros de correntistas. Assim, fariam a verificação da mesma forma, mas sem correr o risco de serem acusados de falsificação.
Mercadante usou o autógrafo que costuma rabiscar em pedaços de papel para admiradores. Simon inventou na hora, em seu gabinete no Senado, onde recebeu a Folha, uma assinatura qualquer.
Foram dois cheques de cada um, todos com assinatura errada. Os dois preencheram um cheque no valor de R$ 350 e outro de R$ 100. Os de valor mais alto estavam em nome do favorecido pelo depósito corretamente. Ou seja, o de Simon, nominal a Mercadante, e vice-versa. Já os cheques de R$ 100 foram postos em nome do repórter que assina esse texto.
A reportagem fez os depósitos em duas agências de cada banco, em São Paulo, e em dias diferentes. Essas medidas foram tomadas para não haver a desculpa de que o problema seria específico de uma das agências ou que teriam ocorrido falhas na compensação em determinado dia.
Os quatro cheques foram compensados normalmente, sem nenhum problema. O mesmo aconteceu com os clientes do Real, porém o teste com seus cheques foi ainda mais longe.
Os dois cheques, um de R$ 150 e outro de R$ 350, estavam em nome de
mulheres, mas foram depositados nas contas de homens. As assinaturas, obviamente, estavam erradas. Um dos cheques foi assinado com letra de fôrma.
A paródia ao poema "Quadrilha", de Carlos Drummond de Andrade, teria sido confirmada sem problemas se cada um tivesse realmente assinado o cheque do outro.
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Muitos cheques
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Devido ao grande volume de depósitos, os bancos não conferem mais as assinaturas de todos os cheques de seus clientes.
Os bancos preferem arcar com eventuais prejuízos -como na compensação de cheques roubados- e ressarcir os correntistas. Isso se o cliente descobrir e reclamar.
A compensação dos cheques é feita por meio magnético, o que não exige a conferência dos documentos físicos.
Muitas instituições, como o Real ABN, terceirizam todo o processo de compensação dos depósitos em caixas rápidos, que são feitos via envelopes.
Nas dependências das terceirizadas, os funcionários abrem os envelopes e verificam somente se o valor preenchido no envelope confere com o do cheque. Se bater, ele apenas separa os cheques por banco. Outro empregado da terceirizada trata, depois, de lançar os valores no sistema para a compensação.
Em nenhum momento eles verificam se o cheque está em nome do favorecido pelo depósito. De nada valem os avisos nos envelopes: "os cheques em nome de terceiros somente serão compensados se estiverem endossados no verso". Por isso, a Folha optou pelos depósitos em caixa rápido.
Fonte: Folha de S.Paulo
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