Usamos termos da tecnologia do século XXI como hashtag, streaming e mouse com aquela indiferença casual, mas você já parou para pensar como essas palavras ficaram tão comuns no nosso vocabulário? Conhecemos as origens do Superman (alienígena), do Homem-Aranha (aranha radioativa) e do Batman (órfão rico querendo vingança), mas não a de palavras como “podcast”, “spam” ou “hacker”. Fui atrás de 21 termos de tecnologia dos mais comuns que foram instalados no nosso HD coletivo para descobrir de onde eles vieram.
Bluetooth
O Rei Harald Gormsson, do século X, é conhecido por unir a Escandinávia – e ter um dente deformado tão podre que chegava a ser azul. Daí seu apelido, Bluetooth (“dente azul”, em inglês). Seu nome cafona e a habilidade de unir os povos inspirou Jim Kardach, um desenvolvedor da Intel, a escolher “Bluetooth” como o nome de um padrão de conexão sem fios que Intel, Ericsson, Nokia e IBM estavam criando, juntas, em 1997.
O nome não foi uma escolha óbvia, não agradou a todos logo de cara, mas como as alternativas eram ainda piores (como “Flirt”), acabaram adotando-o como codinome e até placeholder (um nome temporário) para todo o projeto. As quatro empresas chegaram a um acordo e escolheram o nome PAN, de “personal area networking”. Mas PAN tornou-se rapidamente alvo de críticas por problemas relacionados a SEO, e o produto foi lançado como Bluetooth por puro e simples desespero. O público, porém, adorou o nome e foi conquistado pelo Bluetooth – exatamente como acontecera com o rei.
Podcast
Localmente, a palavra é uma mistura de outras: “pod” (de iPod) e “broadcast” (transmissão no sentido de radiodifusão, em inglês). O termo “podcast” era apenas uma sugestão de Ben Hammersley, em 2004, para a nova tecnologia. Ele tinha como rivais coisas como “audioblog” e “GuerillaMedia”. Mas graças à popularidade do iPod, que fora lançado apenas três anos antes, em 2001, “podcast” tinha um apelo maior e acabou pegando.
Spam
Por muitos anos, spam foi conhecido como uma carne enlatada que era motivo de piada. Tanto que o Monty Python fez um esquete em que a palavra spam era repetida à exaustão pelo garçom, clientes e até um grupo de vikings. Muitos fãs dos humoristas ingleses eram também pioneiros de salas de bate-papo como as da Aol e passaram a usar a palavra “spam” para se referirem a pessoas que criavam macros para dizer a mesma coisa repetidamente, congestionando as salas com coisas nonsense. Então, quando a avalanche de e-mails não solicitados começou a virar uma chateação rotineira nos anos 1990, o pessoal familiarizado com as interwebs começou a chamá-los de spam e a popularidade do termo cresceu tanto que atravessou fronteiras eclipsou o significado original. Ainda hoje as latinhas são vendidas – um pacote com seis, de ~340 g cada, sai por US$ 25 na Amazon.
N00b
O termo “newbie” era usado pelos militares durante a Guerra do Vietnã para designar recrutas e desde então é uma gíria popular para se referir a novatos. Programadores adotaram-no nos anos 1990 e, acompanhando a fala l33t e para dar um ar mais tech, criaram a variação n00b, com dois zeros em vez de “o”.
Troll
Com raízes no folclore escandinavo do século XVII, um troll era caracterizado como uma criatura antissocial, briguenta e estúpida que aborrece seres humanos. Fim da história, certo? Não. A palavra troll na verdade deriva do verbo “trolling”, uma técnica de pesca em que você arrasta um anzol com isca lentamente a partir de um barco em movimento.
Muitos acreditam que o nascimento da “trollagem” online foi no alt.folklore.urban, ou AFU, quando veteranos queriam se distinguir dos novos usuários “pescando-os” com tópicos que já tinham sido debatidos ad nauseam. Quem fisgasse a isca e respondesse ingenuamente as perguntas, se entregaria como sendo um n00b. No final dos anos 1990, porém, o site passou a ser tão acessado que trollar tornou-se um incômodo, dando ao termo um aspecto negativo que hoje lhe é praticamente indissociável. Atualmente o termo tem mais ligação com a sua origem folclórica e geralmente serve para identificar um idiota procurando briga na Internet.
Se você acha que o Google é uma empresa de fazer cálculos, não está tão errado. O nome “google” é, na verdade, uma brincadeira com o termo matemático “googol”, um número representado pelo numeral 1 seguido de 100 zeros. O nome funciona como uma metáfora para a missão dos fundadores Larry Page e Sergey Brin de organizar a quase infinita quantidade de informação existente na web.
Hack
A palavra “hack” era apenas um verbo quando entrou para o vernáculo inglês em 1220, significando um corte brusco ou golpes pesados. Nos últimos anos ela também passou a se referir a truques engenhosos, atalhos, ou “life hack”. Em algum ponto entre esses dois eventos, ela desenvolveu outro significado: “usar um computador para ganhar acesso não autorizado a dados em um sistema.”
O conceito de bagunçar máquinas que a palavra carrega não se originou em meados dos anos 1990, quando Angelina Jolie era uma rebelde novinha com um corte de cabelo pixie cut que andava de patins, mas sim no MIT, em 1955, onde as anotações do Clube de Tecnologias em Modelos de Ferrovias diziam que “o Sr. Eccles exige que qualquer um trabalhando ou hackeando o sistema elétrico desligue a energia para evitar que o fusível exploda.”
Depois, em 1975, a palavra “hacker” apareceu no The Jargon File, um glossário para programadores, com oito definições. A última e única negativa dizia que um hacker era “uma pessoa incômoda e maliciosa que tenta descobrir informações sensíveis mexendo nas coisas.” Claro, essa definição era a mais popular na imprensa nos anos 1990, quando o New York Times a usou três vezes em um artigo sobre Kevin Poulson (o Dark Dante) e Robert Tappan Morris (criador do worm Morris). Sua conotação negativa de um transgressor digital acabou se tornando comum em nosso léxico.
Lulz
LOL, um acrônimo para “laugh out loud”, surgiu nos primeiros dias da web na Usenet. Sua natureza positiva e afirmativa era necessária naquele início da comunicação online para injetar um pouco de humanidade no texto frio e rígido. Lulz é o filho bastardo que o LOL: é mais estridente, uma risada macabra ansiosa por fazê-lo considerar a hipocrisia e injustiça que há no mundo, quase sempre acompanhada de brincadeiras esquisitas.
Lulz é a filosofia central do grupo online Anonymous, nascido em 2003 na seção “anything goes”, ou o board /b/, do 4chan. O local também é conhecido como o mais NSFW da Internet. A natureza feroz e irônica do lulz levou o Anonymous a hackear o jogo infantil Habbo Hotel e bloquear a piscina virtual do jogo com avatares negros transbordando estereótipos raciais e dizendo que a “piscina está fechada devido à AIDS” como forma de protesto contra os administradores do Habbo que o Anonymous acha que são racistas. Não teve muita graça.
IRL
IRL, que funciona como um acrônimo para “In Real Life” (“na vida real”, em inglês), era usado nos primórdios da Internet como uma forma das pessoas se distinguirem defensivamente de suas personas online. (Como em “Se você me conhecesse IRL saberia que não sou um perturbado apesar do meu nick ser H-Romeu.”) Havia um grupo que usava muito desse artifício. Os membros do furry fandom, um lance intrigante de gente que se veste como bicho e tem fetiche com isso (que tentei entender melhor lendo a Wikipédia, mas não rolou), foram os primeiros a aproveitar a oportunidade que a Internet dá de ser outra pessoa – ou, aparentemente, outro bicho peludo. Sério, leia esse negócio e tente entender.
Doxxing
Dox vem de “docs”, ou “documentos”, e se refere ao ato de encontrar um personagem anônimo da Internet (tipo o nosso amigo H-Romeu) e investigá-lo alucinadamente até descobrir documentos que revelem sua identidade real. Digo, IRL.
Stream
Antigamente o pessoal que fala inglês pensava em um rio estreito ou um fluxo contínuo quando ouviam a palavra “stream”. Agora, eles (e nós) pensam em Netflix ou qualquer outro método de transmitir ou receber dados através de um fluxo (daí o nome) constante e estável. O primeiro uso do streaming enquanto verbo foi nos anos 1920, quando um sistema para transmitir e distribuir sinais via rede elétrica tornou-se a base daquilo que depois evoluiria para a música de elevador, que faria o streaming da trilha sonora do inferno para clientes comerciais sem necessitar do rádio. Por mais estranho que pareça, a música de elevador é meio que o avô do Spotify.
Tweet
Você não esperaria que um serviço que valoriza a brevidade, a expressão em 140 caracteres, adotasse uma palavra de 11 caracteres como “twittering” para descrever a sua principal função. Mas quando o Twitter foi lançado, em 2006, “twittering” era o verbo que a empresa usava para descrever o ato de escrever no Twitter. Junto com a frase “Publique uma atualização no Twitter”, o verbo parecia estranho, um passarinho fora do ninho, especialmente para o desenvolvedor Craig Hockenberry. Sua frustração o levou a inventar o Twitterific, um app do Twitter que oferecia uma experiência de uso diferente.
Uma das metas de Hockenberry com o Twitterific era encontrar alguns verbos e substantivos de uma sílaba apenas, incluindo a palavra “twit” (ou sua versão abrasileirada, o tuíte) em vez de “twittering”, em 2007. Claro, twit ainda parecia estranho, mas pelo menos era uma palavra de apenas quatro caracteres. Quando o desenvolvedor empregado do Twitter Blaine Cook reparou que “twit” estava sendo usado no Twitterific, ele sugeriu a palavra “tweet” para Hockenberry e o Twitterific a adotou mais rápido do que uma fofoca se espalha pelo Twitter. O Twitter mesmo, porém, só incorporou a palavra “tweet” oficialmente em junho de 2008.
Hashtag
Antigamente, o símbolo “#” era conhecido apenas como um sinal de libra. Ou para indicar um numeral, como em “Mamãe #1” ou “Toma aqui meu #” se você queria ser descolado com seu Nokia saboneteira em 2003. Mas isso nos EUA. No Reino Unido, o sinal de libra se refere à moeda deles, a libra, ou £. Então, chamar de libra um símbolo que organiza grupos e ajuda a pesquisar no Twitter, que tem alcance internacional, pode ser um problema. Fora dos EUA, o sinal de libra era chamado de “hash sign”, e como a palavra “hashtag” não se refere especificamente ao símbolo “#”, mas ao símbolo e à palavra (ou tag) que o procede , usar o termo hashtag faz sentido.
404
Como você deve imaginar, a frase “404 Nada encontrado/Erro” é meramente um código. Quando se comunica via HTTP, é solicitado a um servidor a resposta a uma requisição – como quando você digita gizmodo.uol.com.br no navegador – com um número, ou um código (404), e uma justificativa opcional legível por humanos (“Nada encontrado”). No código 404, o primeiro dígito, 4, indica um erro no cliente, como uma URL digitada errado (tipo gismodo.uol.com.br). Os dois próximos dígitos, 04, indicam o erro específico, que é o motivo pelo qual o site não foi encontrado.
Emoji
A palavra “emoji” vem dos caracteres japoneses 絵 (e = figura), 文 (mo = escrita) e 字 (ji = caractere). Um japonês chamado Shigetaka Kurita inventou o conceito em 1999 e ele consistia em símbolos simples e rudimentares, como :-) Nada de \m/ E, definitivamente, nada nem próximo dos winks e emoticons animados do MSN Messenger.
Na realidade, Kurita inventou os primeiros 250 emojis que conhecemos tão bem hoje, mas como a sua ex-empresa, a Docomo, não conseguiu patentear a criação, a Apple pegou a ideia e ela se alastrou pelo mundo. Hoje você tem emojis dos mais divertidos, até de um pedacinho de cocô.
Mouse
Em 1950, Douglas C. Engelbart, um jovem audacioso de 25 anos, estava prestes a se casar – e a inventar um dispositivo que revolucionaria os computadores. Quando Engelbart entrou no mundo da computação, as máquinas eram do tamanho de salas e só podia ser acessadas por uma pessoa de cada vez. As frustrações de Engelbart levaram-no a criar o mouse, que ele apresentou naquela que é considerada “a mãe de todas as demonstrações” em 1968 durante uma conferência de informática em São Francisco, e que passou a ser bastante popular duas décadas depois com o famoso computador pessoal Macintosh. O nome “mouse” (“rato”, em inglês) para o dispositivo foi escolhido porque o termo CAT (“gato”, em inglês) era usado para descrever o cursor na tela e parecia que ele estava perseguindo a cauda do desktop.
Warez
Usado por piratas de software para descrever um jogo ou aplicativo crackeado disponível gratuitamente via Internet (danem-se, direitos autorais!), “warez” é só uma brincadeira com a palavra “wares”, e se pronuncia da mesma forma.
Bug
Há provas de que Thomas Edison usou a palavra “bug” (“inseto”, em inglês) em seus cadernos para descrever um sistema com mau funcionamento. Seria a explicação perfeita se computadores existissem quando Edison era vivo. Outra teoria, às vezes contestada, diz que em 1957 Grace Hopper, uma pioneira da programação, estava trabalhando em um computador Harvard Mark II quando o trabalho foi suspenso devido à presença de uma mariposa em um relé. Quando ela comentou que estavam “debugando” o sistema para recomeçar, o termo “bug” relacionado a problemas em computadores nasceu. A mariposa que ela encontrou ainda pode ser vista, e está em exibição no Museu Smithsonian.
Cookies
Cookies são usados para armazenar informações do usuário (como nome e senha) e transmitir essas informações entre site e navegador. Por exemplo, quando você clica no “Lembrar de mim” em um botão, um cookie faz com que o site se lembre de você na próxima visita. O termo cookie é uma comparação com os biscoitos da sorte. Programadores das antigas achavam que havia uma grande semelhança entre um programa que guarda informações dentro de seu código e os biscoitos chineses que guardam conhecimento dentro de suas paredes crocantes.
Wiki
Um wiki, como a Wikipédia, é um grupo de sites interconectados construído pelo engajamento dos usuários. “Wiki wiki” em havaiano significa “rápido”. O criador do wiki, Ward Cunningham, decidiu que um wiki seria uma forma rápida e simples de acessar vários sites e ler sobre coisas como furry fandom (ainda estou intrigado).
GIF
GIF é um acrônimo para formato gráfico intercambiável – no inglês, “graphic interchange format”. Simples. Chato. Nem perto de ser tão legal quanto um GIF de gatinho. O interessante sobre o GIF é que a sua pronúncia correta tem um som de “j”, não de “gui”. Os criadores do GIF na CompuServe, em 1987, preferiam o som do “j”. Hoje, falar “jif” é, além de estranho, um risco de não ser compreendido. Seja um rebelde e fale “guífi” mesmo.
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